sábado, 30 de dezembro de 2023
Provérbio provado rimado - MCCXLII
Provérbio provado rimado - MCCXLI
Deixa que te diga irmão
Não há arte sem solidão
De igual forma a beleza
Só existe irmã da tristeza
Desejamos mais evasões
No meio das multidões
Tememos a rota marcada
E uma vida assegurada
Transpomos várias fronteiras
Contendo imensas barreiras
Para depois no fim aportar
Ao que ainda não é um lar
Que a casa mais bem mobiliada
Não é a que está enfeitada
É a que exibe a substância
A isso atribui importância
Se há muros desalinhados
E alicerces mal encaixados
É que tudo é uma passagem
E a vida tão curta viagem
Interioriza um let it be
Que seja mais fácil para ti
Tomando sem desatino
O que se afigura destino
Enquanto quiseres controlar
O que está em cada lugar
É normal que tu te melindres
Se do teu ego não prescindes
Se o tempo se tornar voraz
Fuma então o cachimbo da paz
Vai com menos sede ao pote
Para não andares num virote
Provérbio provado rimado - MCCXL
Senti-me feliz e completa
Na nossa noite secreta
Foi de tal forma o prazer
É escusado esconder
A cena foi toda perfeita
Fiquei muito satisfeita
E até faço a denúncia
Que adoro a tua pronúncia
Queria pegar no telefone
Ou talvez num megafone
E aos quatro ventos gritar
Que me estou a apaixonar
Provérbio provado rimado - MCCXXXIX
quarta-feira, 20 de dezembro de 2023
Provérbio provado acautelado
sexta-feira, 8 de dezembro de 2023
Provérbio provado cantado
Provérbio provado rimado -MCCXXXVIII
O Rui é daqueles feios
Que mais parecem um bode
Por isso tem tantos rodeios
Não sai de cima nem pode
A falta de auto-estima
Nota-se bem à distância
Por isso o Rui se lastima
Que não lhe dão importância
Enquanto só se queixar
Da sua falta de encanto
A coisa vai descambar
E fica lavado num pranto
Provérbio provado rimado - MCCXXXVII
Mais alto e mais além
Pede a mão do poeta
Mesmo sem ter um vintém
Pra mandar cantar o cegueta
No fundo é pobre coitado
Come as cascas do tremoço
E só não anda definhado
Porque a mãe lhe dá o almoço
As roupas que ele veste
Foi preço que negociou
Numa feira do Oeste
Plo menos não as roubou
Tem sempre aquele ar
Tão único e descuidado
As meias não andam em par
E está podre o seu calçado
O dedo grande do pé
Espreita o sol lá de fora
E cheira tanto a chulé
Que os demais vão embora
Tem pinta de cientista
Detendo um canudo falso
Ou pode parecer um turista
Daqueles de pé-descalço
Provérbio provado rimado - MCCXXXVI
Eu escrevo de alma na mão
Não uso toalha ou roupão
O meu verso está ao léu
Não faço grande escarcéu
Mas eu vejo outros poetas
Escrevendo só duas tretas
E são logo muito louvados
Pelos demais considerados
Eu não quero ser invejosa
Prefiro ser mais talentosa
E não ter o ar sobranceiro
Do aprendiz de feiticeiro
Provérbio provado num verso branco - CXXXV
Provérbio provado rimado - MCCXXXIV
Hoje foi tão difícil o dia
Começou desde cedo a abrir
Quando a colega com azia
Começou a tentar-me oprimir
Mandei-lhe dois berros ou três
Logo a discussão estalou
Porque a gaja na sua vez
Também assim não se calou
E a noite cheinha de mágoa
Apesar de dela não ser fã
Ainda tenho a cabeça em água
Mas só até ser de manhã
Provérbio provado rimado - MCCXXXIII
Enquanto houver língua e dedo
Nada ao João mete medo
Porque com cuspe e jeito
Nenhum buraco é estreito
Por isso ele é gabarola
Parece maluco da tola
Vaidoso mas porém vai treze
Desde que ninguém o despreze
Provérbio provado rimado - MCCXXXII
Tarefa que não dá em nada
É bater punhetas a grilos
Pode ser descabimentada
Seja por chefes ou pupilos
Há outra tarefa semelhante
Que é no bolso jogar bilhar
E até pode ser humilhante
Não ter mais onde o jogar
É pois tarefa solitária
Esse jogo de um para um
E também assaz sedentária
Mais valia um copo de rum
quarta-feira, 6 de dezembro de 2023
Provérbio provado calçado
terça-feira, 5 de dezembro de 2023
Provérbio provado rimado - MCCXXXI
Provérbio provado rimado - MCCXXX
Provérbio provado dissimulado - II
Provérbio provado rimado - MCCXXIX
A Nádia vive receosa
Que alguém lhe roube o lugar
Por isso está desejosa
De ver esse alguém tropeçar
Enquanto vem volta e tropeça
À parte as tarefas urgem
Só faz filmes na sua cabeça
Cheia de ressaibo e ferrugem
Nem é preciso que preguem
À Nádia uma patifaria
Basta que apenas escorreguem
Para logo ficar com azia
Uma vez que vai insistindo
Sempre aos outros retaliar
O mal que ela faz sorrindo
Há-de pagar a chorar
domingo, 3 de dezembro de 2023
Provérbio provado desvalorizado
Já haviam mencionado o caso inúmeras vezes ao presidente da Junta. Ele que sim, que sim, que quando a verba fosse cabimentada, só que afinal não, não se percebia do que estava à espera. Talvez esperasse mais alguns feridos, eventualmente graves, condenados a uma eterna cadeira de rodas, quiçá - e aqui seja o diabo cego, surdo e mudo - uma vítima mortal que fizesse dobrar os sinos e enchesse o cemitério camarário de vivos apreensivos.
Pois se até tinha virado o bico ao prego nas últimas eleições, aliando-se aos seus antigos opositores, quando as sondagens não lhe foram favoráveis! Se nessa altura movera mundos e fundos a fim de manter o poleiro, porque atrasava agora a construção de uma rotunda com semáforos devidamente iluminados ou, quando muito, um conjunto de lombas que fizesse os carros abrandar?
Como estava é que não podia continuar: aquele cruzamento era tão perigoso que engordava as estatísticas do atropelamento local, desafiando a lei das probabilidades. As mães, receosas, não permitiam que os filhos fossem a pé para a escola. As bicicletas contornavam o problema e iam à volta pela Tapada. As velhotas que viviam perto persignavam-se ao menor chiar de pneus. Todos lá na vila viviam angustiados antecipando o despiste iminente.
Só o Zé Mau não se ralava. Com o olhar vidrado posto muito lá adiante, calcorreava alamedas e estradas, só parando para aliviar a bexiga atrás de alguma moita. Diariamente, percorria quilómetros a fio com as suas pernitas delgadas. Não é que o Zé Mau fosse realmente mau: era tão só o doido oficial da terra, ninguém sabia muito bem quem lhe botara tal alcunha.
Numa tarde de Outubro, uma daquelas tardes de precipitação miudinha que tornam escorregadios os pavimentos, quando andava o Zé Mau nas suas deambulações com a cara salpicada daquela chuva molha-parvos, veio um carro travar-lhe aos pés numa chinfrineira de impor respeito. Felizmente não lhe beliscou nem um centímetro de pele. A Dona Clotilde, cuja casa era paredes meias ao cruzamento, assomou de imediato ao postigo num misto de reza e aflição:
- Ó Zé, o qué c'houve?
- É uma hortaliça.
- Nem tudo o que a gente ouve, houve
Provérbio provado num verso branco - CXXXIV
Avançamos pela vida sem rasgo nem deslumbre
No lugar do morto em piloto automático
Atravessando os instantes em câmera lenta
Cada vez mais ignorantes a cada jornada
Esquecidos de que o tempo é um barco veloz
Cujo instinto é engolir a espuma das ondas
Meio cego imprevidente e impaciente
Esse amor-próprio é próprio do tempo
Pasmados de céu e do vaguear das nuvens
Acostumados à medida do relógio
Distorcemos a compreensão temporal
Numa realidade composta de matéria
Onde o que vemos e tocamos se faz lei
Sendo assim o tempo a dimensão da mente
Mas tantas vezes o ontem foi igual há um ano
E o ano passado tal como há dez e há vinte
Quando enfim despertamos já passou
Um intervalo em que acordados adormecemos
Não o futuro não se compadece da imobilidade
O acaso é um caso breve e talvez raro
E a vida de tão fugaz torna-se quase gigante
O dia de amanhã só nos pertence amanhã
O dia de amanhã ainda ninguém viu
Provérbio provado rimado - MCCXXVIII
Com mais um Natal à porta
Não saí da cepa torta
Os presentes quis comprar
E o subsídio sem esticar
Este ano já promete
Novamente se repete
Só que depois no final
Não há presente ideal
Ou já tinha ou vai trocar
Sem intenção considerar
Não foi decisão esperta
A escolha de cada oferta
O melhor da situação
É a família em união
Porque mais que receber
É podermos conviver
O espírito natalício
À partilha é propício
E os Natais de criança
Ficam sempre na lembrança
Como ver na televisão
O Música no coração
Faz parte desse programa
Antes de ir deitar na cama
O bacalhau e o borrego
Tiram ao estômago sossego
E comer bombons com fúria
Demonstra alguma incúria
Depois de tanto enfardar
Resta apenas constatar
Com um semblante tão triste
Que o Pai Natal não existe
Se crês que estou a mentir
Vais tu mesmo descobrir
Que não adianta afinal
Acreditar no Pai Natal
Provérbio provado rimado - MCCXXVII
Noutro tempo a fidalguia
Era muito considerada
Detinha uma freguesia
Por muros bem rodeada
Mas os costumes em queda
Cada classe confundiram
E não há quem interceda
Para que mais interfiram
Que os fidalgos já não são
Pessoas muito decentes
Têm de aço o coração
E moedas entre os dentes
Terminou pois a tutela
Ninguém quer ser aprendiz
Fidalgos de meia-tigela
Trazem honra no nariz