Provérbios Provados noutras casas:

quarta-feira, 30 de julho de 2025

Provérbio provado rimado - MDXXXVII

Pretendes uma boneca 
Que a tudo vá anuir 
Sempre disposta prá queca 
Sem nunca se insurgir 

Uma mulher sem coluna 
E até com poucos miolos 
Porém não vês a lacuna 
A falta que fazem os olhos 

Um ser molengo e obtuso 
Sem grama de personalidade 
De quem possas fazer uso 
Conforme for tua vontade 

Que não te mostre fraquezas 
Que possam forças provocar 
E não tenha muitas certezas 
Para além de poder respirar 

E nenhumas ondas levante 
Nem a tampa lhe salte sequer 
Com nada de novo se espante 
Por não ter direito a escolher 

Constante e também asseada 
Ignorante e deveras casta 
Pensando que à mulher casada 
Apenas o marido lhe basta 


Provérbio provado rimado - MDXXXVI

A natureza dá a vida 
Mas a vida ensina a viver 
Nunca é como foi prometida 
Temos sempre de sobreviver 

No final quem mais aguenta 
É o que está bem adaptado 
Segue a norma e não inventa 
Para não ficar decepcionado 


Provérbio provado rimado - MDXXXV

Quiseste vestir a camisa 
Por tua própria vontade 
E foste imprudente Luísa 
Apesar de já teres idade 

Num imbróglio te meteste 
Vê como a saída preparas 
Pois no fundo não mereceste 
Uma camisa de onze varas 


Provérbio provado rimado - MDXXXIV

Queres que aguente os cavalos 
E que não te pise os calos 
Esperas um espaço alargado 
Não queres ser meu namorado 

Pois dou-te todo esse espaço 
Até precisares de um abraço 
Daqueles que dão falta de ar 
Quando for para o aproveitar 

Desejas que não espere nada 
Mas esteja sempre preparada 
Se quiseres uma companhia 
Que te alegre um mau dia 

Tu verás que esse joguinho 
Irá deixar-te sozinho 
Porque afinal sou esperta 
E não estou de perna aberta 


Provérbio provado rimado - MDXXXIII

Tu vives só de fachada 
No próprio palco actuando 
Para que fique impressionada 
A gente que vai observando 

Só te interessa a aparência 
O que passa para o exterior 
Mesmo que a tua existência 
Vá indo de mal a pior 

Exibes tamanho sucesso 
Uma vida larga e faustosa 
Mas se te viram do avesso 
É publicidade enganosa 

A imagem que tu construíste 
Não reflecte as tuas emoções 
Às vezes também estás triste 
Mas preferes passar ilusões 

Só tu saberás na verdade 
Como és por dentro da pele 
Não se espelha na realidade 
Por isso os outros repele 


segunda-feira, 28 de julho de 2025

Provérbio provado rimado - MDXXXII

Se perguntas a um português 
Como vai a vidinha levando 
Responde lá na sua vez 
Compadre vai-se andando 

Mesmo que a vida a melhor 
Da terra e das redondezas 
Vai sempre dizê-la inferior 
Para prevenir mais surpresas 

A mania que o tuga tem 
De parecer tão comezinho 
É para evitar o desdém 
Do colega e até do vizinho 

Por isso põe-se tristonho 
Dizendo que se Deus quiser 
Mais vale ser enfadonho 
Do que má vida merecer 

E tendo existência boa 
Leva a coisa devagar 
Nesse ir andando à toa 
Para ninguém o invejar 

(Saco de pano à venda na Tiracolo)


quinta-feira, 24 de julho de 2025

Provérbio provado rimado - MDXXXI

O povo inglês chega a horas 
Porque sempre foi pontual 
Faz inveja a muitas senhoras 
Para quem isso é anormal 

Devia ser prática comum 
Num encontro ou obrigação 
Mas ninguém lhe liga nenhum 
O que é falta de consideração 

Não devia ser um exclusivo 
De uma certa nacionalidade 
E até podia ser um motivo 
Para estragar uma amizade 

O facto é que os ingleses 
São no relógio cumpridores 
Por mais que tenham revezes 
Comportam-se como senhores 

É por isso que para designar 
O rigor da pontualidade 
A britânica se vai destacar 
Como sinal de seriedade 


Provérbio provado rimado - MDXXX

Onde vivem as nossas falhas 
E os nossos erros e enganos?
Surgem por vezes ao calhas 
Sabendo só causar danos 

Estampados no nosso rosto 
Ou marcados em cada mão?
É certo que trazem desgosto 
Mesmo que não haja intenção 

Mas a experiência humana 
Indica que qualquer defeito 
Apesar de crer que engana 
Dá origem ao preconceito 

Ele é escrito às escondidas 
Por detrás das nossas costas 
Ainda que tomemos medidas 
Resulta em várias apostas 

É tão clara essa linguagem 
Que assenta no maldizer 
Limitando a uma personagem 
A hipótese de se arrepender 

Defeitos e fraquezas alheias 
São tão fáceis de apontar 
E convivem paredes meias 
Com o que se quer mostrar 

Falar pelos cotovelos então 
É louvável e até preferível 
Do que ter às costas atenção 
Tornando o valor invisível 



Provérbio provado de um santo ignorado

Tinham-no colocado sensivelmente a meio da nave, do lado esquerdo de quem sobe. Até na localização havia ficado prejudicado porque os crentes percorriam o corredor central com uma atenção progressivamente decrescente até ao momento em que, chegados perto do altar, esta redobrava. Mas não lhe adiantaria chorar - a não ser que as lágrimas fossem de sangue -, estava há muito habituado àquele nicho ignorado. A plaquinha de madeira que outrora indicara o seu nome tinha começado a apodrecer, de tal forma que o próprio nome próprio desaparecera e agora já mal se lia a palavra Santo.
As pessoas, que aleatoriamente se persignavam nave afora, paravam às vezes ali por perto nalgum cumprimento domingueiro aos vizinhos ou numa calhandrice em sussurro, porque na casa de Deus não se devia apontar o dedo a ninguém, por mais pecador que fosse - com excepção do taberneiro, do merceeiro e do sapateiro, nem sequer o carteiro se safava.
Reuniam-se em pequenas rodas aqui e ali e, quando ficavam mais aqui, acabavam por reparar naquele canto meio escondido com um santo meio de banda. E não valia a pena tentarem ler a placa carunchosa: a conversa terminava sempre com alguém a perguntar Mas afinal quem é o Santo?
Como não lhe sabiam o nome, as oferendas eram raríssimas. É bem de ver: quem é que no seu perfeito juízo dirige um pedido a um santo que não pode nomear? É toda uma oração para o galheiro, o mais certo é não ser atendida pelo Altíssimo...
As gentes inclinavam-se assim para os santos em montra no altar, muito mais vistosos e bem postos, iluminados pelos enormes círios que o sacristão não deixava apagar.

Num desses fins de tarde de Inverno, em que o largo se enchia do cheiro das lareiras e dos borralhos, o Lobato viera pedir perdão pelos seus pecados. Eram tantos, mas tantos!, que ele nem sabia por onde começar. Palpitava-lhe que uns vulgares Padres-Nossos e Avé-Marias não seriam suficientes.
Não se via vivalma. Lobato percebeu que a hora da confissão já terminara. Levantou-se devagar. Tinha de ir ao encontro do Furtado: estava quase na hora. Levou as mãos aos bolsos. A mão esquerda sentiu o frio da navalha, enquanto a direita apalpava o envelope.
As sombras ocupavam cada vez mais os esconsos da igreja, em contraste com a luz das velas crepitando junto ao sacrário. Lobato olhou lentamente para o seu lado esquerdo e deu com os olhos numa imagem em que nunca havia reparado. O santo, alquebrado, tinha um ar tão abandonado que até metade da tabuleta com a sua identificação caíra.
Meteu de novo a mão no bolso direito. O Furtado nem podia sonhar que aquele dinheiro existia. Sacou do envelope e, num gesto muito rápido, escondeu-o ao lado da caixa destinada às ofertas para o santo anónimo. Depois pensou melhor e optou por o disfarçar debaixo dos pés de barro do dito cujo.
Tocou de novo na navalha dentro do bolso que sobrava, deixando-o vazio. Agora sim, podia ir ao encontro do Furtado.


- Quando a esmola é demais o santo desconfia 

quarta-feira, 23 de julho de 2025

Provérbio provado rimado - MDXXIX

Nem toda a sangria tem vinho 
Ou espumante com frutos vermelhos 
Depende de qual é o barzinho 
E se serve grupos de fedelhos 

Já que existe certa expressão 
Que remete para coisa urgente 
Que precisa de uma solução 
Ou de um fim imediatamente 

É ela a sangria desatada 
Doutro tempo em que a medicina 
Por ser muito menos estudada 
Não receitava uma vitamina 

Para aliviar o mal-estar 
Os doentes eram sangrados 
Com as ataduras a tapar 
Os locais no corpo marcados 

Mas se elas se desatassem 
Acudir era então iminente 
Para que de sangrar deixassem 
E assim não morrer o doente 


Provérbio provado rimado - MDXXVIII

Se ainda não estavas capaz 
Nem sequer te sentias refeito 
Seria excelente ó rapaz 
Descansar até estares perfeito 

Não virias se antes soubera 
Que estavas melhor na caminha 
Não ficavam todos à espera 
Dessa festa que se avizinha 

Não estavas capaz não vinhas 
Mas quiseste armar-te em forte 
E agora as tuas ladainhas 
São as rifas da minha sorte 


Provérbio provado rimado - MDXXVII

Apesar da ferrugem que ganha 
O ferro é tão bom material 
E a sua principal façanha 
É ter dureza sem igual 

Para quebrar essa resistência 
É preciso suar um bocado 
E usar de muita paciência 
Para malhar em ferro forjado 

E sempre que alguém aguenta 
Muitos anos de vida saudável 
Talvez até chegue aos noventa 
Aos oitenta é mais provável 

Sói dizer-se que essa pessoa 
Tem uma saúde de ferro 
Bem maior do que apregoa 
Tão cedo não vai dar o berro 



quinta-feira, 17 de julho de 2025

Provérbio provado rimado - MDXXVI

O André é um pouco matias 
Porque é bastante pateta 
E a sua coisa predilecta 
É ir espreitar as coxias 

Os artistas já estão informados 
De que é tão palerma o André 
E então toleram-no ao pé 
Com os seus discos autografados 

Dá valor a tais colecções 
E insiste nas dedicatórias 
Para registar as memórias 
De todas as suas acções 

No final de cada concerto 
Lá vai o André a trotar 
Para os músicos melgar 
Que se vêem num aperto 

Por pateta ele é conotado 
Totó e também por tontinho 
Mas não gosta de andar sozinho 
Este nosso André coitado 




Provérbio provado rimado - MDXXV

Costumas parecer importante 
Assim à primeira impressão 
Mas dá para ver num instante 
Que não passas de um charlatão 

Até podes ter um diploma 
Na tua sala pendurado 
E quando alguém se assoma 
Fazes-te desinteressado 

Mas o dito na verdade 
Do grande orgulho é motivo 
Tens uma secreta vaidade 
De cada teu ano lectivo 

O canudo vais exibindo 
Porém no meio laboral 
O que te vão incumbindo 
Não sabes fazer afinal 

Sempre que te chamam doutor 
Não enfies essa carapuça 
Apesar de seres bom actor 
És um doutor da mula ruça 



sábado, 12 de julho de 2025

Provérbio provado rimado - MDXXIV

O Miguel é um pianista 
Que sabe exercer a conquista 
Mas pouco mais eu sei dele 
Além de me pedir pele 

Tem um léxico apurado 
Sem ser no entanto forçado 
Tem um pico de ousadia 
Que decerto não recusaria 

Nele me detenho interessada 
Apesar de não prometer nada 
E sinto um frio na barriga 
Que me faz ir na sua cantiga 

Será a cantiga do bandido
Que o faz ser assim pretendido?
Pois a crer na minha intuição 
O Miguel pode ser um cabrão



Provérbio provado rimado - MDXXIII

A Rita aos machos dá trela 
Para que lhe digam que é bela 
E apesar de ter essa noção 
Necessita de validação 

Ela nunca recusa um presente 
Vindo de qualquer pretendente 
Que se tenha logo apaixonado 
E então sua vida estragado 

Vai dando em pequenas porções 
Do amor umas imitações 
Os pobres estão dele sedentos 
E na compreensão são lentos 

À medida que vão tentando 
A Rita vai alimentando 
Mas no fim nunca quer nada 
É pessoa tão amargurada 

Faz por ignorar os protestos 
De quem não se contenta com restos 
Não entendo o que quer ganhar 
Ao ser posta assim num altar 




Provérbio provado rimado - MDXXII

Hoje eu conheci o Luís 
Que não é de todo um petiz 
O seu sobrenome é Barbosa 
Produz bons pedaços de prosa 

Estou a gostar desta conversa 
Que não é todavia perversa 
Que o Luís não é atrevido 
É um tipo muito contido 

Mas terei atenção no entanto 
Não quero largar-me num pranto 
Pois até às resenhas finais 
Os homens são todos iguais 


Provérbio provado calado - II

O Pereirinha é o último dos marialvas lusos. Obedece devidamente ao estereótipo do macho latino: a camisa aberta deixando antever os tufos de pêlos do peito, a bigodaça farfalhuda e o cabelo penteado para trás com um sucedâneo da brilhantina: só lhe falta mesmo um pequeno espeto de madeira mastigado ao canto da boca. Mas colmata facilmente essa lacuna com um palito hidráulico constante, que o trejeito do maxilar e o excesso de saliva nos cantos da boca denunciam.
O Tojó Pereirinha adora trocadilhos brejeiros e larga piropos com facilidade. Tem sempre o botão no On: é o chamado fala-barato que se empolga com o som da própria voz, o galo mais vaidoso das redondezas no seu cocorocó.
Devido à sua personalidade exibicionista apresenta uma postura belicosa: há nele um arruaceiro em latência pronto a explodir ao mínimo pentelho. Sempre que se vê metido em assados nalguma confusão nos espaços públicos, o Tojó roga com desespero um Agarrem-me senão eu vou-me a ele ao companheiro mais próximo e, só depois de já ter os movimentos restringidos pelos braços vizinhos, é que começa a espernear e a despejar injúrias na direcção dos opositores. Quando ele não é um dos intervenientes na briga ou no bate-boca, gosta de exaltar os ânimos, acicatando as hostes com o clássico Havia de ser comigo que eu fazia e acontecia e o diabo a este, mostrando-se tão valente como decidido. Não se deixem, todavia, enganar: é tudo para a fotografia, para inglês ver.
E por falar em inglês - agora esta calhou mesmo bem, nem por encomenda! - denota-se no nosso Pereirinha um interesse excessivo pelas fêmeas de além-fronteiras, em detrimento das portuguesas, o que tem muito que se lhe diga... 
Analisando assim a frio a situação das suas conquistas, é fácil de perceber que as camones não permanecem por cá muito tempo. Surgem, o mais das vezes, em grupos numerosos de mulheres que, ainda mal colocaram o calcanhar em solo portucalense, logo pretendem diversão a todo o custo. Diversão de todos os tipos, o sexual incluído. Regressam passadas duas semanas, se não antes, ao seu chão pátrio. No strings attached. 
É muito conveniente para o Tojó. Fazer a corte a uma mulher nativa dá muito mais trabalho. E - e aqui é que reside o busílis do escaldão - pode sempre descambar numa dolorosa mudança de pele, num abandono mais ou menos aleatório. Por isso, o nosso compatriota protege-se. Ele lá quer que percebam que a sua fraca autoestima não aguenta uma rejeição! 
Então passeia o seu bronzeado nas areias atlânticas à cata de uma ocasional manceba. Como quem caça borboletas: balançando uma rede esburacada que persegue leviana e irreflectidamente as cores mais vibrantes.
Quanto menos elas falarem melhor: o Tojó Pereirinha é um bocado surdo quando lhe convém. Para não mencionar que não domina minimamente outras línguas, já o português é o que é, cuspido às três pancadas. Pois é, quanto menos perguntas lhe fizerem mais o Tojó se dedica à fugaz relação num câmbio abundante de saliva e ronrons um tanto ou quanto dissimulados. Ele gosta é de mulheres assim: que não levantem ondas nem o aborreçam com um fraseado incessante. Que sejam meigas e que não dominem muitos temas, numa poupança de opiniões redundantes. Que permaneçam tão caladinhas como um careca a quem se oferece um pente. E como no supermercado a escolha da fruta mais sumarenta: escolhida apenas com recurso à visão e ao olfacto. Sim, nem caroços nem pevides se manifestam nessa eleição.


- A mulher e a meloa só a calada é que é boa 

quarta-feira, 9 de julho de 2025

Provérbio provado rimado - MDXXI

Se a cabeça tem pouco juízo 
É sabido que o corpo é que paga 
Então o bom senso é preciso 
Para aguentar essa saga 

E mesmo em juízo havendo 
Qualquer erro pode acontecer 
Pode vir alguém que querendo 
A lume o há-de trazer 

Pode vir com intolerância 
E tal falha não desculpar 
E é acto de muita arrogância 
Cuidar que não irá falhar 

Mas depois chega sempre alguém 
Que faz com que o deslize se esqueça 
Lamentando tal como convém 
Vai passar a mão pela cabeça 


terça-feira, 8 de julho de 2025

Provérbio provado rimado - MDXX

No lugar onde fores morar 
É melhor que tentes decorar 
Quais são os costumes locais 
Em que assentam os seus rituais 

E depois de aprenderes imita 
Sem fazer nenhum tipo de fita 
Repetindo de igual maneira 
Dos demais a vida inteira 

Boas vindas assim te darão 
E o panfleto da corporação 
Para que sério te comportes 
Sem ousar o trono dos fortes 

Se um dia pensares que na terra 
A paz podre tem cheiro de guerra 
Vê que para que lá permaneças
Convém que a justiça esqueças 

Um sorriso forçado praticam 
Os tais que no fim sempre ficam 
Separando os restos dos vencidos 
Que não estavam antes precavidos

Esquece então qualquer desconforto 
Esperando que não dê para o torto 
Porque à terra onde tu fores ter 
Faz logo como vires fazer 


Provérbio provado achocolatado

Sempre tinha conhecido a tia Elsa com uns quilos a mais. Era, aliás, a própria que o admitia: Tenho aqui, aqui e aqui uns quilos a mais, enquanto ia apontando a barriga, as nádegas, os seios. Aqui, estás a ver? Uns quilinhos a mais na pança, no cu e nas mamas. E rematava sempre a conversa com uma das suas típicas e sonoras gargalhadas.
Mais tarde, já eu um pouco mais crescida e sapiente, até achava que a tia Elsa recorria tantas vezes a este guião de bolso como estratégia de defesa: antes que calhasse alguém apontar-lhe o dedo devido ao excesso de peso, sinalizava ela a sua silhueta arredondada. É mais para amar, dizia, e ria, ria muito, solteiríssima que só ela, só mesmo para deixar a gente desconcertada.
A tia tinha um calcanhar muito fácil de identificar. Na verdade, a tia tinha dois porque não era deficiente. Mas ia eu dizendo, a sobrinha favorita, que a tia Elsa se perdia por chocolate. Desvairava completamente numa compulsão de tabletes inteiras a eito até lamber os dedos e as sobras doces que se alojavam nas unhas. Negro, branco, de leite com amêndoas, com avelãs: a tia não era esquisita, todos devorava de uma assentada. Era um facto indesmentível: a tia Elsa pelava-se por chocolate. 
Às vezes, talvez com o intuito de chocar os mais moralistas, talvez para se vingar dos que lhe chamavam gorda pelas costas, dizia com um sorrisinho malicioso: Adoro chocolate, cá para mim não há nada melhor, nem mesmo..., vocês sabem, está aqui a criança... E acrescentava: Nesta vida 


- Aquilo que sabe bem ou faz mal ou é pecado 

Provérbio provado rimado - MDXIX

Há quem fique sentado à lareira 

Arengando as acções ao redor 

Tão certo de que a sua maneira 

É sem dúvida nenhuma a melhor 


Tenta passar essa mensagem 

De um benefício para o mundo 

Mas ao ver um rasgo de coragem 

Sente lá uma inveja no fundo 


Por não ter tomates nem gana 

De abraçar a própria realidade 

De abrir de uma vez a pestana 

E deixar de viver pela metade 



segunda-feira, 7 de julho de 2025

Provérbio provado rimado - MDXVIII

Nem tudo é o que parece 
Se não for o que apetece 
Pois as aparências iludem 
E tantas cabeças confundem 

O que ao primeiro olhar se vê 
É igual àquilo em que se crê 
Mas após a primeira impressão 
A ideia não é só reacção 

Como tal não é só de fiar 
No que outrém quer projectar 
Há que verificar do avesso 
Aquele osso por dentro do gesso 


Provérbio provado rimado - MDXVII

Tu fixa o olhar no presente 
E presta-lhe toda a atenção 
Projectar o que está lá à frente 
Não se deve fazer de antemão 

O futuro chegará sozinho 
De forma sempre inesperada 
Põe-te os planos num desalinho
Por vir destapar nova estrada 

Se ela se desenha não temas 
Mesmo se o carreiro é estreito 
Pois não há rota sem problemas 
Logo entra com o pé direito 


domingo, 6 de julho de 2025

Provérbio provado rimado - MDXVI

Bom dia é coisa para os ricos 
Para os outros é mais boa sorte 
Pois acordam feitos em fanicos 
Sem saber qual o Sul e o Norte 

Os pobres despertam cansados 
Nem a noite inteira compensa 
Os seus dias tão assoberbados 
Para tentar encher a despensa 

Não é que lhes fale educação 
Mas deram-lhes cabo da esperança 
E para obter mais satisfação 
Têm de recorrer à poupança 


quarta-feira, 2 de julho de 2025

Provérbio provado rimado - MDXV

És um fulano arrogante 
Que se crê um ser superior 
Achas-te o mais importante 
Deste distrito e em redor 

Mas escusas de vir levantar 
A garimpa para o meu lado 
Porque já me estou a fartar 
De ver esse nariz empinado 


Provérbio provado rimado - MDXIV

Olhaste-me com desdém 
Com um desprezo infinito 
Devolvi-te o olhar também 
Para que ficasses aflito 

Sei morder dente por dente 
Para reagir a uma acção 
E se pensas que és diferente 
Enganaste-te na intenção 

Não é que eu seja vingativa 
Mas prefiro voar sobre escombros 
A não ter sabido ser esquiva 
A um olhar por cima dos ombros 



Provérbio provado rimado - MDXIII

Vi com estes olhos meus 
Que a terra há-de comer 
A tua forma de morrer 
Sem me dizeres adeus 

Aos teus lábios encostei 
Os meus lábios desejosos 
De nenhum fim ansiosos 
E foi assim que me tramei 

Mas vendo em retrospectiva 
O teu vulgar comportamento 
Era de esperar o momento 
Do tal beijo frio sem saliva