Provérbios Provados noutras casas:

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Provérbio suburbano

São 11 da manhã e o Manel Zé conta os parcos trocos que sacou da algibeira. Hoje já chegou tarde à estação e não apanhou a leva dos passageiros que tomam o comboio para os seus trabalhos. No entanto continua de pedra e cal junto às máquinas dos bilhetes no habitual peditório matinal. Desde que foi corrido dos estacionamentos mais próximos pela concorrência desleal, Manel Zé adoptou as máquinas verdes como suas e não arreda pé. Gosta mais destes companheiros de pedinchice que o acolheram num dia de chuva sem perguntas: a velhota que traz o banquinho e a manta e pede num lamento que podia ser o da sua avó, o rapaz da prótese na perna que se senta nas escadas ao lado das muletas, o velho de barbas brancas e sempre o mesmo fato preto que arrasta em passinhos muito lentos, as ciganas romenas que rogam em voz rouca com toda a emoção de um teatro e o pai de todos, o cauteleiro, que, nos dias em que o pregão vende mais sonhos de prémios na lotaria, oferece sopa a todos eles. Aqui está encostado à máquina à espera de uns cêntimos e pensando em como a tarde será complicada dadas as recentes rusgas e apreensões no bairro das compras, quando vê passar o Quim Tó e logo o chama, abrindo a boca no seu sorriso de dentes podres. O Quim Tó traz o ar de quem já matou a ressaca, e diz-lhe generoso:
- Então, ‘tá a render ou nem por isso? Huum...’tava tudo com pressa pr’apanhar o comboio, já vi!. Deixa lá isso pá, e nem penses em ir pós lados da casa do Jardas, a fonte ‘tá seca e aquilo ‘tá cheio de mona. Anda lá comigo, eu consegui orientar-me... mas olha que não é grande espingarda, já te aviso...
- Epá obrigado, que não mora guito no bolso, e mesmo não sendo do bom, sempre ouvi dizer que

- A cavalo dado não se olha o dente



P.S. – Post livre de preconceitos odontológicos, e quiçá tomando um analgésico porque fui hoje desvitalizar um dente.

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