Provérbios Provados noutras casas:

sexta-feira, 16 de outubro de 2020

Provérbio tímido

Até nas fotografias o Leonardo era tímido: se estava em grupo, mal se lhe vislumbrava o perfil que, escondido lá bem para trás entre a turba, parecia que se tinha evaporado; se a custo o obrigavam a uma das suas raríssimas fotografias de rosto, prescindia de olhar a câmara de frente e nunca descolava os lábios ficando sempre com ar ausente. 

O Leonardo gostava das suas rotinas e passar despercebido era para si uma conquista: felicidade que constantemente se dobrava ao peso das suas submissões. Não levantava a voz em nenhuma ocasião, nem para alertar Agarra que é ladrão. O Leonardo entregaria os seus tesouros sem pestanejar de deixaria que, sob o seu olhar, fossem subtraídos a outrém; não por medo, não!, mas por não se querer salientar. 

Qualquer pessoa era, assim, um escadote e ele o seu calcanhar. Pode pensar-se que o Leonardo não se tinha em boa conta, não se dava o devido valor. Erro puro: ele vivia satisfeito por ser um mero grão de areia na poeira do cosmos com a sua reputação de tipo discreto e honesto. 

Longos anos decorriam sem um estremecimento, visto que era competente a ignorar qualquer ofensa como se não lhe fosse dirigida. Se por acaso o tentavam espicaçar até à exaustão à procura de uma reacção minimamente explosiva, o mais que conseguiam era que o Leonardo franzisse o sobrolho levemente. E se lhe perguntavam: Mas porque raio és assim tão tímido?, ele limitava-se a responder calmamente:


- Não é defeito, é feitio 

Sem comentários: