Provérbios Provados noutras casas:

sábado, 31 de outubro de 2020

Provérbio provado num verso branco - CVI

Fazes de conta que te dás 

Só porque sofres por vir um dia a desaparecer 

Quando surges é para que sejas visto e ouvido 

Lido e aprovado neste mundo impassível 

Enquanto ainda há tempo queres 

Transformar-te no domínio das tuas próprias palavras 


Esperas tornar a encontrar aquela aurora que te inebriou 

E que baptizaste de esperança 

Por isso arquivas citações inúteis e poemas sem sentido 



Provérbio provado rimado - CMLXXXIV

Devia ter uma tabuleta 

Cada vez que saio da porta 

Para eu não ser pespineta 

Não dar uma resposta torta 


Como ao pé do trabalho habito 

Estou sempre sempre a encontrar 

Seja um leitor todo bonito 

Seja um dos que tem pior ar 


E logo perguntas disparam 

Como se ali um balcão 

Se uma questão calaram 

Na última vez na recepção 


Explicar-lhes pouco adianta 

Que à folga tenho direito 

Às vezes a conversa é tanta 

Que fico até meia sem jeito 


Bem lhes indico o caminho 

Que conduz à biblioteca 

Para que sigam direitinho 

E parem de me dar seca 


Tem de ser por Bê-á-bá 

Como se estivesse na escola 

Remato com um Blá blá blá 

Adeus que vim só ver a bola 



Provérbio provado um bocado conformado

Passo vidas a encher, a encher... a encher chouriços e a engolir sapos, e sabem Deus e o Diabo quantas as vezes em que rio para não chorar. Por isso, tenho cada vez menos paciência para que me lamuriem ao tímpano. Custa a todos, meus amigos. 


- É assim a vida 

Provérbio provado rimado - CMLXXXIII

O Zé sentiu formigueiros 

E uma dor de ponta e mola 

Chamaram logo os bombeiros 

Que o levaram de charola 


Do lado esquerdo a pontada 

Já fazia temer o pior 

Mas então de madrugada 

O Zé sentiu-se melhor 


Não ganhou para o susto 

Ficou algo traumatizado 

Depois retomou a custo 

A vida com mais cuidado 



Provérbio provado rimado - CMLXXXII

 Sei que não levas a mal 

Se te pedir com fervor 

E até achas original 

Umas pancadinhas de amor



terça-feira, 27 de outubro de 2020

Provérbio provado rimado - CMLXXXI

Eu não tenho uma varinha 

Mas tenho um dedo que adivinha 

E sou toda eu pura intuição 

Mal ponho os olhos num matulão 


Cheiro um embuste à distância 

Seja qual for a circunstância 

E o fulano fica admirado 

Por ser tão cedo rejeitado 


Tento ser subtil à primeira volta 

Refrear a minha língua solta 

Mas se o indivíduo me enoja 

Digo Filho desampara-me a loja 



Provérbio herético

Dizem que Deus não dorme, mas quase podia jurar pelo Diabo que ele, de vez em quando, passa pelas brasas... 

E que faz o Deus que escrevia direito por linhas tortas no infernal mundo dos computadores? O seu papel no cosmos jorra duma moderna impressora a laser e escreve torto por linhas direitas num ficheiro formatado com segunda demão de sinónimos. 

Se a quem não fala Deus não ouve, terá por certo ouvidos de tísico: as orações são por norma sussurradas, a divindade já não vai para nova e até está a ficar um pouco gagá, visto que dá nozes a quem não tem dentes. 

No entanto, conserva ainda algumas faculdades. Por exemplo, é ambidextro: é sabido que castiga com a mão esquerda e afaga com a direita. Mas não é sabido qual das duas põe por baixo ao menino e ao borracho. 

Deus manda que se diga a verdade, mas é um bocado misterioso lá no seu modus operandi. Veja-se a Santíssima Trindade: aquilo cabe na cabeça de alguém? E depois admiram-se que haja São Tomés nesta vida! 

Para os crentes, a justiça do seu Deus é como a chuva: não ocorre todos os meses, mas não falha durante o ano. Só por isso vale a pena louvá-lo semanalmente e passar o seu testemunho aos herdeiros. E porque já que se têm de agarrar a qualquer coisa nesta vida que seja uma coisa que é bem vista aos olhos da sociedade e não lhes faça dar um tiro nos cornos. Porque uma dificuldade tem sempre a magnitude que a pessoa pode suportar e até superar. 


- Deus dá o frio conforme a roupa 

Provérbio provado rimado - CMLXXX

O que nos livros não está 

A vida te ensinará 

Pois no lombo levarás 

Com os cornos marrarás 


Vê lá se tolo não és 

Aguenta e finca os pés 

Sê muito sagaz e esperto 

Prossegue um caminho concreto 


Tudo serve para aprender 

Há sempre algo a reter 

Aonde o tolo se perdeu 

O esperto aviso colheu 



segunda-feira, 26 de outubro de 2020

Provérbio provado rimado - CMLXXIX

Quando a barriga está cheia 

Qualquer fruta tem bicho 

E a sobremesa é uma ideia 

Que mais parece um capricho 


Não cabe nem mais uma agulha 

No estômago a abarrotar 

Que arde do excesso e se embrulha 

É tarde para se lastimar 


Decerto aprendeu a lição 

Aquele que se farta a comer 

Não cede à repetição 

Pois não se farta a lamber 



Provérbio ortográfico

A vírgula tem quase tanta incerteza como o ponto de interrogação. Nunca sabe bem onde se deve encostar: se com o advérbio ou perto do substantivo, sabendo de antemão que com o verbo nem pensar! Na proximidade do ponto e vírgula fica nervosa e as reticências deixam-na em suspenso... 

Às vezes chego à conclusão que as reticências não eram senão... um ponto final. Ou, pelo contrário, que o ponto final afinal era uma coisa que talvez. Outras há em que o ponto é tão peremptório que se rematam as frases nestes termos:


- Ponto final parágrafo 

Provérbio provado rimado - CMLXXVIII

Por ti desinstalei o Tinder 

Já novos matches não faço 

Acho que merecia um Kinder 

E depois do chocolate um abraço 


Ai estou tão feliz contigo 

Que gostas de mim eu aposto 

Pois és também meu amigo 

Engana-me mais que eu gosto 



quinta-feira, 22 de outubro de 2020

Provérbio provado rimado - CMLXXVII

O argumento do burro é um coice 

Tal qual o martelo sem foice 

Só martela essa ferramenta 

Sem a foice ninguém a aguenta 


Como o burro tem duas palas 

Como ele dá o peito às balas 

O patrão versus empregado 

Mais parece um disco riscado 


Claro que o valor não retiro 

Nem ideias patetas atiro 

É uma luta meritória 

Que não deve ser transitória 


Mas um léxico urge inventar 

Que não seja apenas repisar 

Cativar novos eleitores 

Significa comprar dissabores 


Aceitar vozes dissonantes 

Não as ostracizar como errantes 

E cumprir já que se promete 

Guardar de vez a cassete 



Provérbio provado rimado - CMLXXVI

Deves sempre desconfiar 

De quem te lança um desafio 

O que quer é somente esmifrar 

Por-te a andar num corropio 


Por engraxar-te começam 

Dizem que és muito capacitado 

Mas nem que aumentos ofereçam 

Acredita que estás bem lixado 


Desafio é pois eufemismo 

P'ra te porem a vergar a mola 

É linguagem do caciquismo 

Que nos empregos faz escola 



Provérbio provado num verso branco - CV

A poesia é uma coisa a vida é outra 

Nos versos a verdadeira redenção para a dor 

O sangue que cai não mancha as carpetes 

E as lágrimas vertidas engrossam os caudais dos rios 


Na poesia todas as árvores se movem 

Uma estrada leva a uma estrada que leva a uma estrada 

Os calcanhares não podem esmagar insectos 

Qualquer voo em ziguezague tem valor 

E um zumbido não é um teste à paciência 


A poesia é uma coisa a vida é outra 

A merda é a mesma as moscas é que mudam 



Provérbio provado rimado - CMLXXV

Quando aflige o passado 

Por ser coisa que não encanta 

É como ter atravessado 

Um espinho dentro da garganta 


Praticar o despojamento 

Reduzir-se ao essencial 

Marca muito o crescimento 

De maturidade é sinal 


Saber lidar com os destroços 

Libertar o que tem de partir 

Poder destruir os colossos 

Que fazem a vida a fingir 


As memórias poder rasgar 

Como páginas de um caderno

E um novo amor abraçar 

Infinito e quase eterno 


Deixar sem olhar para trás 

Abraçar a constante mudança 

O coração não se desfaz 

Segue em frente com confiança



Provérbio provado rimado - CMLXXIV

A moda dos romances de rainhas 

Que contam cenas comezinhas 

São escritas por umas madames 

Que dão autógrafos em certames 


Há a marquesa de Alorna 

Não teve uma vivência morna 

Há a duquesa do Cadaval 

Com a sua vida colossal 


Também a Inês de Castro 

Que tinha pele de alabastro 

E a Dona Luísa de Gusmão 

Que pariu os filhos num colchão 


Quem as lê são só mulheres 

Não se queixam dos caracteres 

Consomem aquilo num instante 

O seu sucesso é flagrante


E até repetem a leitura 

Se a dama tem muita finura 

Trajada com vestidos aos folhos 

Lança-lhes poeira para os olhos 


Pois a História é romanceada 

Pela caneta foi mutilada 

Mas engolem tudo as leitoras 

Dessas tretas são enfardadoras 



Provérbio provado rimado - CMLXXIII

O José gosta de imitar 

O que é dos outros cobiçar 

É muito pouco original 

De um fraco Eu é sinal 


É apenas contrafacção 

Ele tem falta de opinião 

Há-de ser sempre suplente 

E habitar num ego descontente


O José já é conhecido 

Por ser um mal agradecido 

Até lhe chamam Zé Nabiça 

Quanto vê quanto cobiça 



quarta-feira, 21 de outubro de 2020

Provérbio provado rimado - CMLXXII

Estou tão apaixonada por ti 

Nem creio no que escrevi 

Devia era ficar calada 

Dizê-lo não adianta nada 


Pois se tu pouco verbalizas 

E neste amor pões balizas 

É deitar conversa fora 

Se te digo amo-te agora 



Provérbio provado descarrilado

Senhores passageiros:

Toda a gente flutua e hesita: é uma característica de quem é humano e não anda só a ver passar os comboios: todos os que são curiosos e autenticamente fiéis aos seus fluxos, entram e saem das carruagens, mesmo que às vezes em apeadeiros que não as estações homologadas. Somos na vida uma composição que por vezes descarrila. 


- Andar a ver passar os comboios 

Provérbio previsto - II

O estabelecimento da Dona Joaquina fica no Bairro Antigo, ao lado da loja do Mestre André. Todas as tardes vigia os putos que saem da escola, mas apanham-na constantemente desprevenida. Roubam-lhe fruta, quase sempre maçãs, e gritam-lhe enquanto correm: Ó J'aquina, vem à esquina! 

Na mesma rua, mais acima, tem posição a tasca do Ti João, onde há pão com requeijão ou o que estiver à mão a acompanhar com o verde tinto da terra. O Evaristo também tem lá disto. 

A Ângela é quase tão velha como a Dona Joaquina, mas tem pouco de anjo e prefere a tasca do Ti João à mercearia. És levada da breca, é o que ele responde quando ela lhe pisca o olho: Ó João, mal feches hoje o estaminé, vens comigo, há mês e meio que não vejo o padeiro! 

O Poeta nasceu de colher de prata na boca, mas gosta de onde cheira a torresmos. Perde-se por esta calçada ao fim do dia quando sai da farmácia onde vai ser hipocondríaco para cortejar a Menina Lina que lhe dá verdadeiras dores de cabeça. Entra pela mercearia adentro e pede: Ó Dona J'aquina, embrulhe-me aí um poema. Ela dá-lhe uma maçã e ele segue para casa satisfeito, sabendo que à hora de deitar terá um verso onde morder. 

Depois de enxotar o Poeta uma vez mais, a Menina Lina descerra a grade da farmácia e toma um frasco inteiro de barbitúricos. Todo o Bairro Antigo se acotovela no velório que antecede as exéquias. A Dona Joaquina avilta: Aqueles olhos de carneiro mal morto nunca me enganaram, sempre soube que era doida varrida! O Mestre André aquiesce: sempre desconfiei das pessoas que não gostam de música, olhem que nunca entrou na minha loja, nem para comprar um pifarito! O Ti João acrescenta: nem para pedir um copo de água levantava os olhos do chão, eu já pressentia que tinha um grande mal com ela, coitada! A Ângela rebaixa: sempre tão tapada, tão pudica, tão não-me-toques, o que a falta de sexo faz às pessoas! O Poeta chega enfim, a tempo de largar um shiu no meio do burburinho, e lamenta: eu já previa que ela um dia ia morrer de amor...


- Depois do mal feito todos o tinham previsto 

Provérbio provado rimado - CMLXXI

O Kikas é um bom amigo 

Que se preocupa comigo 

Como ele não há muitos mais 

Quem lhes dera ser iguais 


Porque igual ao meu Kikas 

No meu coração não ficas 

Ele é grande personagem 

Mesmo quando está em viagem 


Esteve anos no Equador 

Em atribulado labor 

Mas quando vem a Portugal 

Como ele não há igual 


Ele é muito terra a terra 

Mas não compra qualquer guerra 

Mas por mim sim comprará 

Mesmo quando não está cá 



Provérbio provado rimado - CMLXX

Quando me olho ao espelho 

Não reconheço a imagem 

Parece que sou um velho 

Composto de cartilagem 


Não noto pernas nem braços 

Nem a cara ou o pescoço 

Há um corpo aos pedaços 

De músculos e só um osso 


Ao espelho só vejo nervos 

Muitas coisas palpitantes 

São emoções em acervos 

Conjunto de vários instantes 


E quando do espelho me afasto 

Os defeitos só sabem crescer 

O cérebro vem por arrasto 

Se o corpo pensa em morrer 


As alegrias fenecem 

Recordo apenas o erro 

Só tristezas prevalecem 

Quando a máquina dá o berro 


(Ilustração: @catarinaqualquercoisa 

www.instagram.com/catarinanasnuvens) 



domingo, 18 de outubro de 2020

Provérbio provado rimado - CMLXIX

O Antão era pastor 

De dia guardava o gado 

Tinha uma nódoa no corpo 

De se encostar ao cajado 


O gado que ele guardava 

Era um rebanho de ovelhas 

E ainda por companhia 

Tinha um cão sem orelhas 


Que não arredava pé 

Do lado do nosso Antão 

As ovelhas tresmalhavam 

Até chegar ao portão 


À noite sonhava com elas 

E seus discretos balidos 

Desejoso de ao acordar 

Não as encontrar aos caídos 


Era um homem tão simples 

Que tinha uma vida tranquila 

E mesmo com um cão surdo 

As ovelhas faziam fila 


Agora que o conheceste 

Irás recordar esta história 

Assim por ser tão singela 

Já te ficará na memória 


E sempre que "atão" disseres 

Surgirá um corrector 

Que logo te fará lembrar 

Que Antão era pastor 



Provérbio provado rimado - CMLXVIII

O Zé não ama o progresso 

À modernidade é avesso 

É um tipo antiquado 

Nas opiniões atrasado 


Considera que a moral 

Foi uma coisa temporal 

Já que os actuais costumes 

Só lhe despertam queixumes 


Na sua aparência exterior 

Ele mais parece um andor 

E não usa nada de plástico 

O Zé é um bota de elástico 



Provérbio provado rimado - CMLXVII

São os jovens agricultores 

Enterrados nos seus labores 

Que mais solicitam subsídios 

Para não viverem em presídios 


Uma mão à frente outra atrás 

A sua vida da terra se faz 

E rezam para que as tempestades 

Não os visitem nas herdades 


Vivem isolados em montes 

Onde não habitam as fontes 

E contratam jornaleiros 

Que lhes descasquem sobreiros 


Esperam que não venham gripes 

Que lhes penhorem os jipes 

Têm casacos oleados 

Também sapatos remendados 


Alguns fazem criação 

De animais ao serão 

Mas galinheiro e chiqueiro 

Não lhes trazem dinheiro 


Jamais vão enriquecer 

Nem ter momentos de lazer 

Focinho de porco e galinha de bico 

Nunca fizeram o homem rico 



Provérbio provado rimado - CMLXVI

Quem acha que a terra é plana 
E esse argumento explana 
Se vai do Brasil ao Japão 
Decerto vai em contramão 

Pois já dizia o Galileu 
E por isso foi que ele morreu 
Que é bem redondo o mundo 
E ele estudou-o a fundo 

Por cá andamos às voltas 
A atar as pontas soltas 
Este mundo é uma bola 
Quem anda nele é que se amola 


Provérbio provado rimado - CMLXV

Não venhas histórias contar-me 

Que queres dormir em conchinha 

Eu dou logo sinal de alarme 

São histórias da carochinha 


O que tu queres sei eu bem 

É sexo sem compromisso 

Mas não estou virada porém 

Para ao amor seres omisso 



Provérbio provado disputado

Era uma tarde de tal forma quente lá na aldeia que até as moscas dormiam. Quem não fazia a sesta, amodorrava-se em qualquer cadeira de braços com um jornal ou uma revista no colo, deixando as tarefas caseiras para quando viesse a fresquinha. 

O Ti Manel ressonava, como habitualmente a seguir ao almoço, na sua poltrona de pele vermelha com o trombone ao lado, o companheiro de surdez que se afadigava para alinhar com a toada nos domingos em que a filarmónica lá da terra se apresentava. 

Estava então o Ti Manel musicando com as suas cordas vocais, quando duas vizinhas se pegaram numa disputa infeliz e tão desbragada que lhe acordou os tímpanos preguiçosos. 

Parece que foi uma coisa sem importância que uma disse e a outra afinou, convencida que a frase inocente a si se dirigia como uma crítica velada. Instalou-se imediatamente a desconfiança e as comadres começaram a ralhar querendo cada uma ter razão, fazendo oscilar no corpo os aventais cheios das supostas verdades a descoberto. 

O Ti Manel ainda veio de lá a botar água na fervura, mas foi debalde e demasiado tarde: as duas senhoras já tinham avermelhado de raiva e as veias das têmporas ameaçavam explodir-lhes. O Ti Manel suspirou, meteu o trombone no saco e afastou-se entristecido por não ter conseguido apaziguar a contenda entre as duas comadres. 

O resultado foi zangarem-se para a vida, levando as respectivas famílias a tiracolo ao ponto de os maridos deixarem de brindar e as crianças de brincar. Quando calhava em conversa alguém indagar o motivo de tal peleja, ambas se desmanchavam no mesmo estribilho:


- Não sei, não quero saber e tenho raiva de quem sabe 

sexta-feira, 16 de outubro de 2020

Provérbio estival

Ai, que saudades eu tenho de Agosto... Mesmo quando o Agosto é mais chuvoso ou menos estrelado, eu tenho sempre saudades de Agosto. 
Eu tenho saudades desse Agosto das tardes cheias de mar, dos gestos lentos sobre a areia. 
Tenho principalmente saudades das tardes de Agosto, dos instantes que se prolongam sem propósito, do mar ser mais longe que a linha do horizonte.

- Tardes de Agosto passam de encosto 


Provérbio provado rimado - CMLXIV

Às vezes a ovelha ruim 

Tão tresmalhada assim 

Faz perder um rebanho 

O caso não é tão estranho 


Mas quase sempre a ovelha 

Procura a sua parelha 

Para ter uma sua igual 

É uma atitude normal 


E a ovelha que é mansa 

Durante o dia descansa

Mama a sua própria mama 

E ainda a alheia reclama


Do bando a ovelha pior 

Não leva sempre a melhor 

Pois é a primeira que espirra 

Enquanto com as outras embirra


A ovelha que não tem dono 

Por ter falta de patrono 

É o lobo mau que a come 

Ninguém repara que some 


As mulheres como as ovelhas 

Reinam até serem velhas 

E ainda está para nascer 

Quem de ambas há-de entender 



Provérbio provado magicado

Senhoras e senhores, meninos e meninas, acerquem-se ao terreiro da feira das vaidades! Por apenas uns soldos, vejam arder os autênticos paus de dois bicos e observem os cintos de castidade com chaves triplas e ainda muitas emoções com tectos falsos. É obrigatória a visita às tendas, onde poderão pôr um olho no burro e outro no cigano, dar uma no cravo e outra na ferradura e, além do mais, assistir ao espectáculo do nosso mágico a distrair atenções com lenços de várias cores ao mesmo tempo que diz:


- Nada na manga 

Provérbio dos olhos alheios

A maioria das pessoas tem-se em elevada conta: pensa que tem uma personalidade especialmente complexa, que se veste bem e que tem sentido de humor. Também crêem que escrevem bem, mas dá-se o caso de muitas nem conseguirem alinhavar um simples mail onde seja possível compreender o explanar das suas ideias; é-lhes difícil espraiar o verbo num simples parágrafo com princípio, meio e fim, o que dá origem tantas vezes a uma troca de correspondência electrónica que mais se assemelha a uma conversa de surdos. 

Se as pessoas fossem constantemente filmadas nas suas manias, que calculam invisíveis aos olhos dos outros, e nos seus esforços de mal sucedida comunicação, dariam por si deveras surpreendidas com o simplismo do seu ego, a falta de exuberância da sua presença e de rasgo das suas piadas. E, se pudessem ler-se a si mesmas com a firmeza de um revisor profissional, reestruturariam a quase totalidade das suas frases. 

Os olhos dos outros muitas vezes sabem mais de cada um que o próprio e as cabeças alheias radiografam com maior exactidão o alinhamento da sua coluna vertebral. 


- Quem está de fora é que racha lenha 

Provérbio tímido

Até nas fotografias o Leonardo era tímido: se estava em grupo, mal se lhe vislumbrava o perfil que, escondido lá bem para trás entre a turba, parecia que se tinha evaporado; se a custo o obrigavam a uma das suas raríssimas fotografias de rosto, prescindia de olhar a câmara de frente e nunca descolava os lábios ficando sempre com ar ausente. 

O Leonardo gostava das suas rotinas e passar despercebido era para si uma conquista: felicidade que constantemente se dobrava ao peso das suas submissões. Não levantava a voz em nenhuma ocasião, nem para alertar Agarra que é ladrão. O Leonardo entregaria os seus tesouros sem pestanejar de deixaria que, sob o seu olhar, fossem subtraídos a outrém; não por medo, não!, mas por não se querer salientar. 

Qualquer pessoa era, assim, um escadote e ele o seu calcanhar. Pode pensar-se que o Leonardo não se tinha em boa conta, não se dava o devido valor. Erro puro: ele vivia satisfeito por ser um mero grão de areia na poeira do cosmos com a sua reputação de tipo discreto e honesto. 

Longos anos decorriam sem um estremecimento, visto que era competente a ignorar qualquer ofensa como se não lhe fosse dirigida. Se por acaso o tentavam espicaçar até à exaustão à procura de uma reacção minimamente explosiva, o mais que conseguiam era que o Leonardo franzisse o sobrolho levemente. E se lhe perguntavam: Mas porque raio és assim tão tímido?, ele limitava-se a responder calmamente:


- Não é defeito, é feitio 

Provérbio provado num verso branco - CIV

Repara agora em mim 


Repara que se te chamo não é para te aprender 

Mas para que te veja a saberes-me cada vez mais 

Por isso toco à campainha do prédio que és tu e depois fujo 

Enquanto perguntas duas vezes quem é quem sou 


Repara que à medida que a tua curiosidade vai crescendo 

Vou surgindo e desaparecendo tal as cartas de um mágico 

Ciente de que o impalpável mistério leva ao extravio do ânimo 


Repara como me exponho num alfabeto sem éfes e érres 

Cheio de pontas soltas com vocábulos por inventar 

Tantos que se chegares a escrever em mim lamentarás 

Teres empreendido a sequência de frases tamanhas 


Repara que não pontuo os meus versos propositadamente 

Senão ficavas a conhecer todos os meus segredos não era? 



quinta-feira, 15 de outubro de 2020

Provérbio provado rimado - CMLXIII

Mais uma rima esgalhada 

Que trago a esta morada 

Para te poder entreter 

Não tem muito que saber 


Uma rima emparelhada 

Que componho irmanada 

No fim está bem de dizer 

Uma expressão a condizer 


Se tu não lhe achas piada 

Não és homem não és nada 

Mas aqui vou permanecer 

E tu podes desaparecer 




Provérbio provado rimado - CMLXII

Nós somos um algoritmo 

Não se compadece do ritmo 

Fugaz da vida moderna 

Que tanto nos passa a perna 


Corremos sempre apressados 

De casa aos supermercados 

E destes para o vão labor 

Tão fardados a rigor 


Pagamos as contas todas 

Atentos às várias modas 

Pensamos que o vil metal 

É algo de especial 


Mas esse é grande engano 

Que causa bastante dano 

Só vivemos pela metade 

Dinheiro não traz felicidade 



quarta-feira, 14 de outubro de 2020

Provérbio provado num verso branco - CIII

Pergunto ao nervo onde o esconderijo 

Inquiro pela alma transparente 

Procuro a casa nas empenas e rodapés 

Mas só descubro a escada para o inferno 

Onde se engasgou todo o ruído do mundo 


Piso cuidadoso os degraus que escorregam 

Para não rodar em pirueta na escuridão 

Sei que desço para longe da casa 

De onde o gato saiu e os ratos se passeiam


 


Provérbio provado rimado - CMLXI

Nascemos no mesmo dia 

Com uns anos de permeio 

E temos o coração cheio 

Parece telepatia 


As almas assim como as nossas 

Sentem-se quase irmãs 

Mesmo se às vezes órfãs 

Por sobreviverem às mossas 


Só agora estão unidas 

Sabendo que entre irmãos 

Ninguém deve meter mãos 

Muito menos suas feridas 


Uma mais nova outra velha 

Falamos a mesma língua 

Que nada deixa à míngua 

Assim nos dê cá na telha 


Um reencontro se obriga 

Porque afinal já sabemos 

Que de outro mundo viemos 

Para alcançar uma amiga 




Provérbio provado num verso branco - CII

O tempo envelhece no verde das estátuas 

O seu maxilar tragando os futuros 

Dos quais sobram migalhas nos museus 


O tempo espiga cabelos e enrola bigodes 

Curandeiro dos males que a bondade perpetuou 

Embalando sonhos sem melindre nem paraíso 


Ponteiros aprumados e folhas de calendário 

São polícias que vigiam a vida e a morte 

E os contribuintes que apenas matam o tempo 


Lento como um nenúfar que eclode 

Ou supersónico como a medida da luz 

Não é uma viagem de que se possa regressar



terça-feira, 13 de outubro de 2020

Provérbio provado rimado - CMLX

Eu não consigo explicar 

O que sinto sem pensar 

Por um minuto ou dois 

No que vou dizer depois 


A minha boca é discreta 

Por querer ser tão correcta 

Não magoar gratuitamente 

Quem que como eu sente 


Sou honesta no entanto 

Às vezes reagem com espanto 

Quando dou uma opinião 

Não pretendo ter razão 


Não levo a minha avante 

Com esta postura distante 

Fico mais longe do céu 

Ai de mim se não fosse eu 



Provérbio provado rimado - CMLIX

O Carlos é um putanheiro 

Disfarçado de literato 

Aborda de modo grosseiro 

Lança a escada ao desbarato 


As fêmeas são as suas presas 

Que gosta de perseguir 

E sejam magras ou obesas 

O Carlos só se quer vir 


Gosta de engraxar a esposa 

Nas suas redes sociais 

Mas ele é velha raposa 

Flirtando com as demais 


Um dia vai dar barraca 

O seu modus operandi 

Duma liga sai uma faca 

E o Carlos não é mais dandy 



Provérbio provado rimado - CMLVIII

É lido da frente para trás 
Também de trás para a frente 
O ovo e o osso que faz 
Com que se prenda no dente 

Até mesmo o nome da Ana 
E o moderno aparelho radar 
São lidos de forma humana 
Tão fácil é de decorar 

A arara é uma ave 
Que tem uma asa porém 
Palíndromos palavra-chave 
Ou são capicuas também 

Assim se aprende a lição 
Por isso toca a reler 
E nesta quadra em questão 
Ver onde se foi esconder 

Aqui às voltas se andou 
Que quem não tem que fazer 
Uma saia até costurou 
Descoseu e tornou a coser 


Provérbio provado num verso branco - CI

A cada nova linha velhas palavras 

Que trazem à casa que se edifica 

Muitos convidados desconhecidos 

Mas fecham sem querer a porta 

Àqueles que já dormiram no tapete 


As palavras fazem aproximar dos distantes 

Que se identificam com os cenários criados 

E apartar de quem está mais perto 

Que insiste em se ver retratado 

Lendo entrelinhas nas linhas inventadas 


Escrever é por isso um acto solitário: 

Só quem cria sabe ler de cabo a rabo 

Os demais apenas retêm o que interessa

Também por isso a leitura se faz sozinha:

Só quem lê sabe ler de cabo a rabo 

Pois quem escreveu só enfatizou o que quis 



Provérbio provado rimado - CMLVII

Se eu sou para ti uma flor 

Tu és o meu jardineiro 

Que rega com tanto amor 

O meu caule dianteiro 


Quando os meus espinhos picarem 

Perdoa não é com maldade 

Se os ergo é por estarem 

Maduros de infelicidade 


Mas as pétalas compensam 

Aqueles prováveis tormentos 

E fazem com que se esqueçam 

Alguns dos piores momentos 


Elas têm cores faiscantes 

De tão belas quase doem 

Florescem assim importantes 

A Primavera constroem 


Quando no Outono da vida 

O teu jardim for um vaso 

A tua flor envelhecida 

Será ainda sério caso 


Mais pálida e mais disforme 

Continua a embelezar 

O teu desejo conforme 

Esteja à mão de semear



segunda-feira, 12 de outubro de 2020

Provérbio provado enciumado

Estava ali parada à minha frente, os braços encolhidos, defensivos. Os olhos pareciam opacos de tão tristes, como se naquelas lágrimas mudas me culpasse pela separação. Eu bem me queria esconder atrás dos meus mais do que sólidos argumentos, mas aquele olhar não me dava hipótese de fuga: era órfão de dúvida e sem ela queria ferir-me com o espectáculo da sua quase morte. Ainda consegui balbuciar: Só o conheci depois, nada tive que ver com o vosso afastamento... Mas os olhos dela não tiveram pena da minha falta de pena, apenas me lançaram um desprezo imenso, tão sólido que me atravessou as vértebras. Eram-lhe indiferentes quaisquer palavras: já tinha encontrado uma culpada e isso era mais fácil do que tentar perceber o desamor. 


-  O ciúme nasceu cego e morreu surdo 

Provérbio provado rimado - CMLVI

No fim afinal não interessa 

Se isto foi feito à pressa 

Se de facto é bom ou mau 

Tem metáforas a dar com um pau 


Se tem adjectivos a mais 

Ou se agrada aos demais 

Se tem alguma coerência 

Ou apenas é incongruência 


Se a minha voz aparece 

Se com tanto ruído fenece 

Só importa que tem de sair 

Como obrigação a cumprir 


Se o que escrevo vale a pena 

Ou se é poesia plena 

Só pertence a quem me vai ler 

E o faz com olhos de ver 



sábado, 10 de outubro de 2020

Provérbio provado num verso branco - C

Quando ele voltar não te atrevas 

A esquecer como quebraste quando partiu 

Diz-lhe que a tua concha favorita não é o seu colo 

Onde já pensaste um dia poder adormecer 


Diz-lhe que não pode andar às voltas com a tua cabeça 

E o teu coração prefere uma só viagem 

Várias falsas partidas tornam-no indiferente 

Inspirar e expirar é mais do que apenas respirar 

O sangue bombeia promessas que desse modo ficam sem casa 


Diz-lhe tudo isso em jeito de resposta 

Às perguntas que ele nunca soube fazer 

Para que seja tua a última palavra 

Que ficará a ressoar durante a tua ausência 


Diz-lhe que segundas terceiras quartas oportunidades 

Têm um preço que nada tem que ver com a estéril vingança 

É o juro da tua indiferença 

Quando se senta numa cadeira nada mais a demove 


Diz-lhe que a sua falta deixou de provocar-te um aperto 

Que a sua presença já não te faz elevar 

Nos confins do teu corpo ainda há espaço para o amor verdadeiro 

Que seres correspondida não pode ser uma surpresa 


Quando ele enfim voltar diz-lhe toda essa firme despedida 

Sem pestanejar nem entregar o ouro ao bandido 



Provérbio provado num verso branco - XCIX

Amigo não empata amigo 


Mas já iniciei de ti o esquecimento 

Quiseste partir de mim antes da tua morte 

Oferecer-me a desilusão de perder uma amizade sem elegância 

Com palavras amargas como setas que não voltam atrás 

Se calhar só foste fiel ao que sempre foste e eu não via 

Não sentirás a minha falta não sentirei a tua 

Um percurso interrompido por causa de um pontapé numa pedra 



Provérbio provado num verso branco - XCVIII

Escrever é derramar um ataque de soluços no papel 

Libertar os pensamentos da efémera consciência 

A inspiração pode brotar de tantas águas 

Que fazem despertar num arrepio 

O gesto da caneta sobre a superfície acolhedora 

Escrever é o eriçado reflexo da pele de galinha 



sexta-feira, 9 de outubro de 2020

Provérbio provado rimado - CMLV

Quem aposta na frivolidade 

É pessoa pela metade 

Dos temas não vai ao fundo 

Vive apartada do mundo 


Alimenta-se da aparência 

Que falta de consciência 

O que é denso não a seduz 

Só ao espelho é que vê a luz 


Carros e roupas de marca 

No falso estatuto embarca 

Mas encontra imensos pares 

Tem amigos aos milhares 


Séries e programas da moda 

Comenta só na sua roda 

Reproduz fúteis piadas 

Decora lições estudadas 


É de questionar essa vida 

Assim tão pouco preenchida 

Que não tem mais amplo desejo 

E anda como o caranguejo 



Provérbio provado rimado - CMLIV

Há gente tão inflexível 

Prefere quebrar que torcer 

Tudo lhe parece impossível 

Não é capaz de ceder 


Às vezes dobrar um pouquinho 

Dar a mão à palmatória 

Impede que se fique sozinho 

A braços com a memória 


Pois ninguém tem sempre razão 

Ninguém é dono da verdade 

Deve aceitar outra mão 

Não é uma fragilidade 



Provérbio provado rimado - CMLIII

Tenho a mania que sou queque 

Mas conduzo um calhambeque 

Acho muitas pessoas cretinas 

Não me toques que me desafinas 


Ando com o cabelo arranjado 

O bâton nunca está esborratado 

Engoli um cabo de vassoura 

Tenho pretensões de senhora 



Provérbio provado rimado - CMLII

Pareces-me demasiado perfeito 

Quando caíres vai tudo a eito 

Porque não há carne sem osso 

E nem há fruta sem caroço 



Provérbio provado rimado - CMLI

Nada tem quem nada lhe basta 
Essa é atitude nefasta 
Desejar o que não pode ter 
É um trilho para sofrer 

Tem de aprender a dosear 
E não estar sempre a embandeirar 
Quem quer mais do que lhe convém 
Perde o que quer e o que tem 


Provérbio provado rimado - CML

Os amigos e os caminhos 

Mal pisados ganham espinhos 

Que é preciso frequentar 

E a ambos considerar 


Não é graxa é cuidado 

Saber como têm passado 

Não custa um telefonema 

Ou um convite para o cinema 


Não há como o conselho 

Que dá um amigo velho 

Sabe ouvir e encaminhar 

Melhor que um familiar 


Não é um querer postiço 

É de preservar por isso 

Amigo fiel e prudente 

Vale mais do que parente 



Provérbio provado rimado - CMXLIX

Renego do homem rico 

Que com suas asas cobre 

Depois morde com o bico 

Em todo o que é pobre 


Apresenta-se como amigo 

E só sabe prometer 

Até engana um mendigo 

Para logo desaparecer 


Guarda para si toda a soma 

Para o seu trono de rei 

Só que mais vale um toma 

Do que enfim dois te darei 


Que não faça uma promessa 

Que não vai depois cumprir 

Respeite a quem lhe peça 

Para seus bens dividir 



Provérbio provado rimado - CMXLVIII

Sabes que qualquer construção 

Terá de começar no chão? 

Esquece por ora o telhado 

Só no fim ele é alcançado 


Vai construindo por etapas 

Dessa progressão não escapas 

Não queiras tudo de uma vez 

Isso são manhas de burguês 


Chegarás a compreender 

O porquê de assim se fazer 

E verás que é uma conta boa 

Quantos paus leva uma canoa 



Provérbio provado num verso branco - XCVII

Quem muito pede nada tem 


Para poderes provar de tudo poupa o teu paladar 

E para conseguires conhecer algo priva-te de querer saber tudo 

Apenas entenderás pouco pois com a compreensão grassa a dúvida 

Se queres obter coisas terrenas abstém-te da necessidade da posse 

Porém se o teu desejo é ser uno nunca almejes ser nada 



Provérbio provado rimado - CMXLVII

Tolos são os que emprestam 

Não compram os ajuizados 

Pois estes sabem ser poupados 

E os outros depois arrestam 


Ideal é manter-se de fora 

E demais bens não cobiçar 

Apenas do que é seu cuidar 

Quem empresta não melhora 



Provérbio provado rimado - CMXLVI

Viajante que vai apressado 

Não viaja acompanhado 

Come léguas em seu redor 

A paisagem já sabe de cor 


Pelo caminho não vê nada 

Só sabe pensar na chegada 

E a viagem leva a cabo 

Enquanto esfrega um olho o diabo 



Provérbio animalesco

Tenho esta teoria bastante racional que o ser humano é muito mais irracional do que qualquer animal. Senão vejamos:

- Quando sente uma dor aguda e desagradável do lado esquerdo por baixo das costelas tem dor de burro;

- Quando está num estado de grande excitação ou ansiedade está em pulgas;

- Quando fala com grande arrogância mas não tem onde cair morto está a cantar de galo e comer de pito;

- Quando se move vagarosamente anda a passo de caracol;

- Quando está arrepiado com frio ou com medo fica com pele de galinha;

- Quando fica amuado está a amarrar o burro;

- Quando não responde a uma pergunta é porque o gato lhe comeu a língua;

-Quando não é inteligente o bastante diz-se que é esperto mas não caça ratos;

- Quando não faz nada ou se atrasa ou se demora está a encanar a perna à rã;

- Quando se vê num grande embaraço ou se acha em apuros vê-se em palpos de aranha;

- Quando não reage em situações desagradáveis e ofensivas tem sangue de barata;

- Quando é uma pessoa com muita experiência e que não se deixa enganar é raposa velha;

- Quando come muito até ficar enfartado enche a mula;

- Quando está numa situação difícil com pessoas que não lhe dão apoio está entregue à bicharada. 

E até em relação ao estado civil se encontra um paralelismo no mundo animal:


- Solteiro é pavão, noivo é leão e casado é burro 

quinta-feira, 8 de outubro de 2020

Provérbio provado rimado - CMXLV

Em nós este Outono prometido 

A minha mão na tua permanece 

Pressinto quando o ardor é fingido 

Vejo se o rubor empalidece 


Sou feita toda de intuição 

Cada tua veia eu adivinho 

E sei antecipar de antemão 

Cada vez que preferes estar sozinho 


Afasto-me um momento e dou-te dicas 

Para melhor poderes lidar comigo 

No entanto estranho se não ficas 

Fechado à la longue no teu abrigo 


Faço logo um filme completo 

Mas creio que me possa enganar 

Pois não há amante discreto 

Nem louco que saiba aconselhar