- No meu tempo não era assim. Os americanos lá foram à lua, muito bom, muito bonito, sim senhor, é o progresso, mas afinal acabaram com a meia-estação. Agora ora está um frio de rachar ora um calor de escaldar, o que aconteceu ao Outono e à Primavera, podes dizer-me?
No meu tempo isto não era realmente nada assim. A televisão era a preto e branco e só havia dois canais. E olha que chegava muito bem: a bem dizer, quando me sento no sofá ao fim da noite, estou tão cansada, mulher, que já nem vejo nada.
No meu tempo a vida era boa. Quando era solteira era bonita, sabes? Tive muitos pretendentes, só que o Ramiro foi o mais teimoso, não saía aqui da rua sempre a topar a minha janela.
No meu tempo a música era outra. Agora é só barulho. Nestas novas canções não encontro as velhas melodias. Ai os bailes da associação, tu lembras-te? Aquilo é que era ritmo, aquilo é que era divertimento.
Tenho saudades do meu tempo, Maria! Ando sempre pendurada em recordações que já só vivem nas molduras. Não preciso de calendário para ter o passado tão presente. Nem para morrer, calha bem, que a minha hora também há-de chegar, ninguém cá fica para contar a história.
Ai o meu tempo, o meu rico tempo de juventude... Estes miúdos de agora parece que têm um ar meio esgaseado e só prestam atenção ao telemóvel, foi a maior droga que lhes foram arranjar. O vício é de tal forma que isto qualquer dia explode, filha, rebenta tudo num grande estouro como um balão.
No meu tempo...
- Mas, que porra!, rebenta tudo o quê, pá? Tu tens cada uma...
- O mundo, Maria, este mundo. Está à beira do fim. Tu não vês o que é? Escuta com atenção o que te digo...
- É o fim do mundo em cuecas
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