Provérbios Provados noutras casas:

domingo, 9 de julho de 2023

Provérbio provado num verso branco - CXV

O POETA DE IVA ZERO 


Este poeta não limpa regularmente o pó aos móveis

Nunca se lembra de comprar o passe com antecedência 

Foi sempre incapaz de compreender as taxas de juro 

Não vigia a tensão arterial nem o colesterol

Tem ciclos de sono tão irregulares como a sua escrita 

Este poeta anda sempre à boleia dos acontecimentos 


Tudo nele vai ao encontro do improviso do imprevisto

Não lhe vive um pingo de auto censura nas hélices duplas

A própria sequência dos nucleótidos foi nele um fruto do acaso 


O poeta desconfia que as vidas não fazem qualquer sentido

Mas continua a insistir em caminhar no sentido contrário

Que as direcções opostas também precisam de representantes 

E todo o percurso pede o seu percursor 


Como não ambiciona servir de exemplo dá-se ao luxo

De ignorar tendências e seus respectivos apertos de mão 

De não frequentar as escolas de estética que matam a estética 

O poeta dedica as duas orelhas dois olhos duas mãos 

Ao momento de assombro que dá origem a cada novo verso 


Não deixa de sofrer as consequências da sua natureza

Que ressalta com o impacto da revolta da rejeição até do insulto

Não cimentou as paredes na construção da dita zona de conforto

Essa divisão imaculada e moderadamente aquecida 

Onde se vai escondendo a modernidade




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