- Anda daí, Alzira, está na hora do almoço! Se te demoras, daqui a bocado não temos lugar no refeitório. Já sabes que são sete cães a um osso...
Alzira largou a escova de cabelo, comprimiu os lábios em frente ao espelho e seguiu a colega escada acima.
Uma hora e meia chegava e sobejava para comer e ainda dar três dedos de conversa porque dois nunca eram suficientes.
O refeitório era grande e bem equipado e tinha até uma estante a um canto cheia de livros que ninguém folheava mas à qual as chefias chamavam pomposamente biblioteca. Ocupava uma área significativa do primeiro andar e era a menina dos olhos da administração. Por isso, ninguém estranhou quando na semana anterior entrou sala adentro uma jornalista ladeada por um fotógrafo, um cameraman, o patrão maior do hipermercado e respectivos lambe botas. Lá vinham eles exibir-se para a televisão e os jornais, querendo demonstrar as verdadeiramente fantásticas condições que davam aos empregados, esperando desviar as atenções dos baixos salários.
- Repare, sra. dra., na nossa biblioteca ali ao canto, ideal para uma pequena pausa após o almoço.
- Chame-me só Celeste, pela sua saúde! Sou apenas uma jornalista, não passo atestados médicos! E não me leve a mal, mas a biblioteca não deve ter lá muito uso, quer-me parecer. Por certo outras coisas fariam mais falta aos seus empregados... Ora e com quem é que posso trocar umas palavrinhas? - e virando-se para o grupo mais perto - Talvez aqui com esta senhora? Como se chama, quer dizer-nos? Ah, que engraçado!, Alzira era o nome da minha tia favorita. Já lá está, coitadinha... Mas então posso fazer-lhe uma ou duas perguntas, Alzira?
A jornalista parecia não saber muito bem ao que vinha, mas assim que se ligou a luz da câmara e o fotógrafo apontou a objectiva, transformou-se como que por magia. Quis saber ao pormenor tudo o que a Alzira fazia, se gostava daquele emprego, se o ordenado era o bastante para viver r quais as regalias que tinha, onde morada, se tinha filhos, tudo tim tim por tim tim - a Alzira chegou a recear que lhe fosse perguntar a cor das cuecas. Ficou muitíssimo vermelha, pois não gostava nada de ser o centro das atenções, mas de quando em vez lá deitava uma espreitadela pelo canto do olho para a câmara. Até que a jornalista se saiu com esta:
- Agora, para terminr, vou fazer-lhe uma pergunta difícil. Ou fácil, dependendo da perspectiva. A Alzira é feliz?
- Olhe, sra. dra... Ah, sim, Celeste, desculpe. Sabe o que é que eu lhe digo?
- Feliz é quem diz
terça-feira, 30 de janeiro de 2018
Provérbio provado entrevistado
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