Extremamente idealista, a Sílvia tinha uma mente de tal forma aberta que pairava cem anos luz à frente das pessoas comuns que constantemente se chocavam com a sua originalidade e franqueza lapidar.
Sendo uma bela balzaquiana, estava no entanto solteira após duas relações que não haviam resultado. Não acertara à primeira nem à segunda: o Alberto era do tipo clássico e conservador e não se adaptara às suas propostas de relacionamento aberto; por sua vez, o Mário era o mais libertário possível e fugira a sete pés face à sua sugestão de um casamento tradicional.
Era caso para dizer que a Sílvia andava com os palpites trocados! Mas aos dois perdoou sem ressentimento, pois era uma mulher que não se sentia presa a convenções e formalidades: encontrava-se livre, leve e solta e ia passeando pelas relações, coleccionando amizades eternas e amando da sua forma muito particular, sem distinções.
Depois de alguns casos fugazes sem grande significado, cuidou que à terceira era de vez quando lhe surgiu o promissor Daniel que, contudo, cedo se começou a revelar demasiado passional: reclamava que ela tratava toda a gente na mesma medida, dando até mais atenção aos amigos do que ao próprio. Tornou-se a questão uma constante causa de amuos e ciúmes e insegurança da parte do Daniel na relação íntima.
A Sílvia começou a ficar deveras ansiosa: a intimidade não era de facto o seu apanágio e ficava angustiada por ter de se relacionar muito tempo com uma só pessoa - ainda por cima do calibre do Daniel - quando a conversa não evoluía para outros estratos, o seu tipo de orgasmo favorito era o mental. Despachou o assunto sem delongas, perante um choroso Daniel, recusando-se a tolerar a sua possessividade e resignando-se a ficar só por uns tempos.
Dado que era fascinada por novas ideias e conceitos avançados, sabia enfim que para parar numa única relação o parceiro teria de ser muito criativo e excitante, respeitar as diferenças e não lhe tolher os movimentos. Assim continuou a Sílvia: já menos inquieta, já com menos pressa de ser feliz, mas sempre surpreendente e imconvencional. Só uma coisa insistia em não tolerar: que não lhe viessem com hipocrisias e falsos pudores!
- Perdoar uma vez mas não três
Sem comentários:
Enviar um comentário