Provérbios Provados noutras casas:

quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

Provérbio citado (WALSER)

« (…) O meu colega, de resto, é um homem mais velho e mais infeliz, antigo proprietário de uma cestaria que se arruinou na sequência de infortúnios vários e que agora trabalha à jorna como copista, tal como eu, só que eu não pareço copista nem jornaleiro, mas sim um inglês excêntrico, ao passo que o meu camarada parece alguém que se recorda constante e dolorosamente de melhores dias. A maneira amável e comovente como caminha e como assente sempre com a cabeça conta a história da sua desdita numa linguagem que não conhece a vergonha. É um homem mais velho e já não quer impressionar ninguém, quer apenas manter-se de pé. Mas impressiona-me a mim, porque eu conheço o seu sofrimento e o peso que carrega nos ombros e o esmaga. Sinto orgulho em caminhar com ele num bairro tão elegante e aproximo-me dele sem qualquer embaraço para assim demonstrar o meu apreço espontâneo pelo seu fato de qualidade inferior. Deparo-me com vários olhares estupefactos, um ou outro fabuloso par de olhos que parece interrogar-me, e isso diverte-me, para o diabo com os outros! Falo alto e com grande ênfase. O fim do dia é tão propício à conversa. Trabalhei o dia inteiro. É magnífico passar o dia a trabalhar e depois sentir um bonito cansaço que nos reconcilia com tudo e com todos. Não ter um cuidado, um pensamento. Poder passear com ligeireza, com a sensação de não ter feito mal a ninguém. Olhar em volta para ver se agrado a alguém. Sentir que agora sou um pouco mais digno de amor e respeito, em comparação com os dias que passei a mandriar, dias que caíram num abismo e se esvaneceram como fumo. Sentir muito, sentir inteiramente este fim de tarde oferecido! Sentir o fim da tarde como uma oferenda, porque é uma oferenda, de facto, para quem passou o dia a trabalhar. Assim se dá e assim se recebe

 In Os irmãos Tanner – Robert Walser

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