Provérbios Provados noutras casas:

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Provérbio provado viciado

As notícias publicadas nos jornais cantavam parangonas em louvor ao euro: estava-se no tempo da transição do escudo e fazia-se ainda a multiplicação por duzentos vírgula outros três números. Que crise, que lá!, o euro era moeda boa, viçosa e fresquinha, que apetecia gastar.

Ele transportava-se pela profissão com perfeição, o euro era ouro na sua mão, misto de Midas e Adónis com cauda de pavão. Vaidoso, vaidoso. Todo o ser se projectava para fora, como um filme dedilhado a pulso pelo realizador. Nos momentos em que não tinha de estar a fingir, podia então recolher-se aos seus corredores envoltos em trevas.
Até que um dia, o consumo esporádico e tão-só recreativo se transformou em sujeição ao vício. Isto foi antes das consultas, muito antes da suspeita de que um dia precisaria dos médicos e medicamentos; isto foi na época em que se supunha no controlo das vontades. E em que ganhava bom dinheiro, que lhe sustentava tanto o vício como as aparências.
Vivia sozinho em casa própria e, quando estava normal, dava jantares para os amigos, onde fazia as vezes de esforçado cozinheiro e anfitrião afável. Dera-se porém ao cuidado de arrendar uma casa no bairro mais esconso da cidade, na viela mais pútrida desse bairro, com os passeios carregados de traficantes e viciados. Aí, nessa casa, despia a máscara e dava-se à evasão total. Nem sequer se pode dar o nome de casa a um quarto minúsculo, com a sanita e o lavatório a um canto e um colchão piolhoso no outro.
Nunca ninguém soube desse refúgio durante mais de dez anos; alguns amigos dos jantares chegaram a visitá-lo na clínica, outros não foram a tempo.

- O que o dinheiro dá o dinheiro tira

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