Provérbios Provados noutras casas:

quarta-feira, 24 de maio de 2023

Provérbio provado jamais atacado

Jurou de si para si, com toda a solenidade de que foi capaz, não mais tornar a sofrer por amor. Desta última vez fora deveras complicado, deparando-se com uma tremenda dificuldade em engolir o abandono, sentindo-se imensamente amargurado durante um tempo prolongado e com uma auto-estima tão microscópica que parecera ter-se dissolvido nas partículas do ar que o sufocava. Porque durante um largo período não pôde sequer encher os pulmões de ar até ao fim, tal era no peito a ansiedade. E até a sua passada, outrora enérgica e ritmada, se transformara num arrastar lento, pois os joelhos eram agora inseguros e os pés haviam perdido a firmeza.

No meio deste sofrimento prolongado, ainda fora obrigado a escutar da boca da mulher que o deixara que o par de meses decorridos era mais do que suficiente para a digestão da rejeição. Ela propunha até que se estabelecesse entre ambos uma relação com contornos amigáveis. Ele, porém, ficou furioso com tal atitude que, a seu ver, era mais condescendente do que apaziguadora, podendo dessa forma verificar que nela não restava nenhuma réstia do anterior apego que crera verdadeiro. Mandou-a à merda com todas as letras, lamentando não ter o alfabeto mais algumas para lhe lançar. Ela virou-lhe então as costas em paz com a sua consciência: pois se ele não queria fazer as vezes de amigo, que mais podia ela propôr? Curiosamente, ele ficou aliviado com tal desfecho: não mais teria de olhar para a cara da amada, entregando a memória das suas feições ao esquecimento até quase se esfumar. O difícil trabalho da saudade faria o resto.

Deu-se então o referido momento de negaça ao destino, o minuto em que jurou que jamais sofreria por causa de mais alguma mulher. De onde desenterrou tão férrea vontade não se sabe, tendo nesse instante inspirado uma tal golfada de ar que lhe revigorou os alvéolos mais remotos. Para não mais se deixar atingir pela seta de Cupido, estabeleceu uma regra de defesa extrema: não permitir que nenhuma fêmea se aproximasse. Mas cedo percebeu, à medida que ia recuperando a auto-estima, que era uma forma pouco eficaz de se proteger, uma vez que deixava o coração livre para novo fracasso. Tratou então dê se inscrever numa aplicação de encontros, dando assim espaço ao órgão que palpita - e demais órgãos palpitantes - para bater em muitas e variadas direcções, dispersando a atenção. Sim, estava certo de que esta era a melhor defesa...


- A melhor defesa é o ataque 


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