O Paulo deixou a escola tão cedo que nem aprendeu convenientemente a ler e a escrever. Eram muito, tão!, pobres lá em casa que era preciso trabalhar para ajudar a família. Não foi prejudicado nem privilegiado: todos os quatro irmãos Santos tiveram a mesma sorte.
O Paulo tornou-se então precocemente um miúdo a alancar nas obras com homens feitos. Saía com eles após o trabalho e iam para as tascas beber e fumar; às vezes iam às meninas para aliviar a tensão. Em tudo o Paulo alinhava, sentido-se crescido, achando que aproveitava da melhor forma o dinheiro que não tinha que entregar em casa.
Um dia conheceu o amigo de um colega. O Alberto era barulhento, divertido à brava, um pouco apoquentado, e andava sempre com uma valente moca. Tinha um carro vistoso, amarelo, e começaram a dar umas voltas e a andar sempre juntos, o Paulo e o Alberto. Foi assim que o miúdo que se achava suficientemente crescido fumou o primeiro charro e em poucos meses já estava a dar no cavalo. Deixou de entregar dinheiro em casa. Na casa onde já quase mal aparecia.
Até começarem a fazer bombas de gasolina foi um pulinho. Operavam com facas, de noite, perto da hora do fecho. O Alberto é que era o cabecilha: engendrava os ataques, conduzia o carro, extorquia o dinheiro e dava voz de comando ao Paulo que se limitava a fazer figura de corpo presente, empunhando a faca enquanto a ressaca tomava conta de si.
Claro que a sorte um dia deixa de bater à porta e foram catados. No xelindró o Paulo desbroncou-se todo e entregou o Alberto que ficou preso. Os polícias acenaram-lhe com um tratamento e foi o bastante para o Paulo vislumbrar uma hipótese de um futuro diferente e uma reaproximação à família Santos.
Foi para uma comunidade terapêutica no meio do campo onde esteve um ano a tomar metadona e a fazer intrincados exercícios psicológicos. Chegou a ter uma paixão platónica por uma rapariga de boas famílias que se tinha agarrado à cocaína e que tomou em mãos a tarefa de o ensinar a ler e a escrever.
Saíu limpo, disposto à reinserção social e a ir tirar um curso de cozinha. Regressou para casa dos pais e logo na primeira semana reencontrou velhos colegas e amigos do bairro: a notícia de que tinha voltado correu célere.
Numa noite voltava sozinho a pé do café e saiu-lhe ao caminho um sujeito desdentado. O Paulo só teve tempo de ver a lâmina da faca e ouvir a frase: Venho da parte do Alberto, ele manda cumprimentos da prisão...
- Bandido bom é bandido morto
quinta-feira, 5 de dezembro de 2019
Provérbio do bom bandido
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