A Ana era pequenota e rabitesa e gostava de levar a sua avante. Desde criança chocava bastante com a mãe que não escondia a preferência pela irmã mais nova de mais fácil trato; aliás a própria mãe lhe apunha frequentemente o carimbo de temperamental e lhe relembrava o seu irritante mau feitio. No entanto, a auto estima da Ana não saía beliscada pelos constantes mimos da mãe e continuava a fazer o que lhe dava na real gana.
Como não gostava lá muito de estudar, ao contrário da irmã, decidiu ir trabalhar logo que terminou o liceu. A mãe arengou o mais que pôde quando tomou conhecimento da decisão:
- Muito me engano ou não te aguentas por lá muitos Janeiros, Ana, com esse feitio que tu tens! Ou arrepias caminho ou correm contigo em dois tempos. Tens de ser mais branda, não podes levar tudo assim a ferro e fogo nem esperar que comam e calem e te façam as vontadinhas todas!
A Ana virou costas acabrunhada, empinou o nariz e foi à vida, mas cedo percebeu que a mãe tinha alguma razão pois logo nos primeiros dias de labor teve de engolir alguns sapos e se eram bem gordos!
Pegou-se instantaneamente com uma colega mais rabitesa que ela que padecia da severa agravante de se fazer de sonsa em frente da chefe. A Ana não gostou da atitude dissimulada e disse-lhe poucas e boas para quem quis ouvir. Acontece que a outra não se ficou e, quando a apanhou sozinha, desferiu-lhe um tal chorrilho de provocações e ofensas que deixaram a Ana a um canto sem colo num pranto de baba e ranho.
Quando chegou a casa e relatou à mãe o sucedido ainda teve de escutar a máxima:
- Quem diz o que quer ouve o que não quer
terça-feira, 31 de dezembro de 2019
Provérbio provado provocado
Quem prova provérbios gosta de aliterações
Provérbio provado rimado - DCCLVI
O Rui anda cheio dele
É ouro é prata é cobre
O dinheiro é que o impele
Tem sempre tanto que sobre
Deu cabo do casamento
Por causa do vil metal
À mulher não era atento
Ficou pois só no final
Suspeito que o Rui não fica
Por muito tempo sozinho
Que o bolso cheio dá pica
A quem lhe dê bom carinho
Enquanto o Rui se gabar
Que dele assim anda cheio
Companhia não vai faltar
Nem sexo sem muito rodeio
É ouro é prata é cobre
O dinheiro é que o impele
Tem sempre tanto que sobre
Deu cabo do casamento
Por causa do vil metal
À mulher não era atento
Ficou pois só no final
Suspeito que o Rui não fica
Por muito tempo sozinho
Que o bolso cheio dá pica
A quem lhe dê bom carinho
Enquanto o Rui se gabar
Que dele assim anda cheio
Companhia não vai faltar
Nem sexo sem muito rodeio
Quem prova provérbios gosta de aliterações
Provérbio provado rimado - DCCLV
Se muito gostas de criticar
As falhas alheias apontar
Olha bem o teu dedo primeiro
Antes de acusares o parceiro
É que o dedo pode estar sujo
E tu seres considerado sabujo
Não firas levianamente
Sê de ti mesmo consciente
As falhas alheias apontar
Olha bem o teu dedo primeiro
Antes de acusares o parceiro
É que o dedo pode estar sujo
E tu seres considerado sabujo
Não firas levianamente
Sê de ti mesmo consciente
Quem prova provérbios gosta de aliterações
Provérbio perdido
Chegou a casa com os bolsos vazios e o bucho cheio de whisky. Mais uma noite perdida num corpo desconhecido de quem não recordaria o nome nem as feições. O desejo iludido, o desejo escondido só por umas horas.
De manhã acordou sem querer acordar. O quarto estava escuro e deixou-se ficar nos lençóis que cheiravam a álcool e a tabaco. Ao meio dia o telefone tocou, deu-lhe uma trolitada para que ficasse em silêncio.
Eram seis da tarde quando finalmente se ergueu da cama. Foi à cozinha e abriu o frigorífico num gesto maquinal: praticamente vazio. Bebeu um copo de leite azedo e voltou para para o quarto. Dormiria até terminar aquele fim de semana, sem verificar o telefone nem comer nem tomar banho.
- Perdido por cem, perdido por mil
De manhã acordou sem querer acordar. O quarto estava escuro e deixou-se ficar nos lençóis que cheiravam a álcool e a tabaco. Ao meio dia o telefone tocou, deu-lhe uma trolitada para que ficasse em silêncio.
Eram seis da tarde quando finalmente se ergueu da cama. Foi à cozinha e abriu o frigorífico num gesto maquinal: praticamente vazio. Bebeu um copo de leite azedo e voltou para para o quarto. Dormiria até terminar aquele fim de semana, sem verificar o telefone nem comer nem tomar banho.
- Perdido por cem, perdido por mil
Quem prova provérbios gosta de aliterações
Provérbio provado rimado - DCCLIV
Amigos nem tudo são rosas
Nos jardins onde verto as prosas
Por isso tantas rimas escrevo
Em três minutos as levo
Emparelhadas ou cruzadas
E às vezes interpoladas
São flores bem mais singelas
As margaridas amarelas
Nos jardins onde verto as prosas
Por isso tantas rimas escrevo
Em três minutos as levo
Emparelhadas ou cruzadas
E às vezes interpoladas
São flores bem mais singelas
As margaridas amarelas
Quem prova provérbios gosta de aliterações
Provérbio provado rimado - DCCLIII
Se não consegues o olho pregar
Em frente à TV vais pastar
Mas quando o programa não presta
O zapping é o que te resta
Agarras firme no comando
E pelos canais vais andando
Vês casas remodeladas
E ouves vozes afinadas
Vês programas de culinária
Com comida nada ordinária
Enquanto a sandocha preparas
Com outros canais te deparas
Não te fixas em nada de jeito
Não há documentário perfeito
E por fim de forma imprevista
Vês os casados à primeira vista
Quando crês que bateste no fundo
Miras os maiores lagos do mundo
Atacados por algas insanas
Lá cerras enfim as pestanas
Depois quando raia o dia
Acordas com zero energia
Com as costas tortas do sofá
E a TV no programa que está
Em frente à TV vais pastar
Mas quando o programa não presta
O zapping é o que te resta
Agarras firme no comando
E pelos canais vais andando
Vês casas remodeladas
E ouves vozes afinadas
Vês programas de culinária
Com comida nada ordinária
Enquanto a sandocha preparas
Com outros canais te deparas
Não te fixas em nada de jeito
Não há documentário perfeito
E por fim de forma imprevista
Vês os casados à primeira vista
Quando crês que bateste no fundo
Miras os maiores lagos do mundo
Atacados por algas insanas
Lá cerras enfim as pestanas
Depois quando raia o dia
Acordas com zero energia
Com as costas tortas do sofá
E a TV no programa que está
Quem prova provérbios gosta de aliterações
Provérbio provado rimado - DCCLII
Promessas não hão-de faltar
Assim haja votos para dar
Mas não te fies em favores
Desses grandes senhores
Assim haja votos para dar
Mas não te fies em favores
Desses grandes senhores
Quem prova provérbios gosta de aliterações
segunda-feira, 30 de dezembro de 2019
Provérbio provado rimado - DCCLI
O Luís é um meia leca
Mas tem uma grande estaleca
Aos grandes não fica a dever
Ele consegue surpreender
É pequeno porém arrumado
Tem um ar bem apessoado
E uma boa massa cinzenta
Que cheia de ideias fermenta
Eis porque não se deve julgar
Pela pequenez um mau par
O Luís é a prova disso
É capaz de lançar bom feitiço
Mas tem uma grande estaleca
Aos grandes não fica a dever
Ele consegue surpreender
É pequeno porém arrumado
Tem um ar bem apessoado
E uma boa massa cinzenta
Que cheia de ideias fermenta
Eis porque não se deve julgar
Pela pequenez um mau par
O Luís é a prova disso
É capaz de lançar bom feitiço
Quem prova provérbios gosta de aliterações
sexta-feira, 20 de dezembro de 2019
Provérbio provado rimado - DCCL
Para que surja a beleza
Em todo o seu esplendor
O silêncio deve com certeza
Existir em seu redor
Que todo o ruído cesse
Para a arte contemplar
A beleza logo aparece
Numa ilusão de pasmar
Mas ela é bem relativa
Não tem como nem porquê
Depende da narrativa
Dos olhos de quem a vê
Em todo o seu esplendor
O silêncio deve com certeza
Existir em seu redor
Que todo o ruído cesse
Para a arte contemplar
A beleza logo aparece
Numa ilusão de pasmar
Mas ela é bem relativa
Não tem como nem porquê
Depende da narrativa
Dos olhos de quem a vê
Quem prova provérbios gosta de aliterações
terça-feira, 17 de dezembro de 2019
Provérbio provado rimado - DCCXLIX
Cantar a plenos pulmões
Uma bela zarzuela
Render-se às emoções
Duma serenata à janela
A viola a tiracolo
E uma voz de bagaço
Quase com um torcicolo
Uma nódoa negra no braço
Assim faz de noite o Vicente
À porta da sua amada
Mas o vizinho descontente
Atira-lhe uma vassourada
O Vicente logo se esconde
No mais próximo buraco
Nem sequer ao outro responde
E mete a viola no saco
Uma bela zarzuela
Render-se às emoções
Duma serenata à janela
A viola a tiracolo
E uma voz de bagaço
Quase com um torcicolo
Uma nódoa negra no braço
Assim faz de noite o Vicente
À porta da sua amada
Mas o vizinho descontente
Atira-lhe uma vassourada
O Vicente logo se esconde
No mais próximo buraco
Nem sequer ao outro responde
E mete a viola no saco
Quem prova provérbios gosta de aliterações
Provérbio provado rimado - DCCXLVIII
Vamos embora à vida
Já que a morte é tão certa
Melhor é que seja esquecida
Mas um dia os calos aperta
Vem morder-nos os calcanhares
A mafarrica da foice
No meio de tantos azares
Não podemos dar-lhe um coice
Mas enquanto cá andarmos
Outras coisas apertam os calos
Que remédio senão aguentarmos
Ou desatamos aos estalos
Tenhamos sempre um sorriso
Mesmo com os pés apertados
Paciência e calma é preciso
No fim vamos todos deitados
Já que a morte é tão certa
Melhor é que seja esquecida
Mas um dia os calos aperta
Vem morder-nos os calcanhares
A mafarrica da foice
No meio de tantos azares
Não podemos dar-lhe um coice
Mas enquanto cá andarmos
Outras coisas apertam os calos
Que remédio senão aguentarmos
Ou desatamos aos estalos
Tenhamos sempre um sorriso
Mesmo com os pés apertados
Paciência e calma é preciso
No fim vamos todos deitados
Quem prova provérbios gosta de aliterações
segunda-feira, 16 de dezembro de 2019
Provérbio provado com cuidado
Quando chega ao fim do dia, o João agarra nos braços e nas pernas e dirige-se à casa da tia Leonor de quem é cuidador informal. A Lena sai às seis e deixa o jantar feito e a tia já de banho tomado e pijama vestido, passando ao João o testemunho.
A tia Leonor foi diagnosticada com Alzheimer há três anos mas, enquanto a demência ainda não galopara, manifestou sempre vontade de permanecer na sua casa. Os dois filhos, demasiado ocupados com os seus trabalhos e famílias nucleares, contrataram a Dona Lena e ofereceram cama, mesa e roupa lavada ao errante primo em troca da companhia que faria à mãe de noite.
Acabado o terceiro matrimónio fracassado, o João aceitou de imediato: ficara sem poiso e andava a dormir no carro; além disso, tinha uma dívida de gratidão para com a tia que dele cuidava em menino quando a mãe se refugiava no álcool. A mãe do João, a irmã mais nova de Leonor, entretanto já falecida, mergulhava nesse refúgio tão amiúde que, se não fosse a tia, tantas vezes a criança ficaria sem jantar.
Por isso, o João retribuía com genuína boa vontade e dava agora o jantar à tia, levando-lhe a comida à boca em aviõezinhos com uma paciência infinita. De seguida, lavava e enxugava a louça enquanto a tia roncava alto em frente à televisão.
Levava-a depois para a cama com todo o cuidado para não a despertar totalmente, pois a tia Leonor fazia birras infantis para não se deitar. Verificava a fralda, ajeitava os cobertores, dispunha os chinelos ao lado da cama e ligava a luz de presença no quarto. Muitas vezes era acordado durante a noite pela tia que vagueava pela casa, toc toc toc, com os botins calçados: ia dizer ao sobrinho que preparasse as malas que queria ir para a terra. O João, com todo o desvelo, lá a convencia a regressar ao leito.
Numa manhã gelada de Janeiro, o telefone do João tocou e tocou. Que estranho!, a Lena raramente liga tão cedo... Que fosse depressa, a tia apagava-se...
Numa manhã gelada de Janeiro, dias depois, foi o funeral da tia Leonor. No fim do cerimonial, os dois filhos enlutados acercaram-se de um lacrimejante João. Mas ao invés de um obrigado e duas palmadinhas nas costas, apressaram-se em pedir: Ó primo, importas-te de devolver agora as chaves de casa da mãe? Queremos ir lá separar umas coisas e, como vês, já não precisamos dos teus serviços...
- Muito se engana quem cuida
A tia Leonor foi diagnosticada com Alzheimer há três anos mas, enquanto a demência ainda não galopara, manifestou sempre vontade de permanecer na sua casa. Os dois filhos, demasiado ocupados com os seus trabalhos e famílias nucleares, contrataram a Dona Lena e ofereceram cama, mesa e roupa lavada ao errante primo em troca da companhia que faria à mãe de noite.
Acabado o terceiro matrimónio fracassado, o João aceitou de imediato: ficara sem poiso e andava a dormir no carro; além disso, tinha uma dívida de gratidão para com a tia que dele cuidava em menino quando a mãe se refugiava no álcool. A mãe do João, a irmã mais nova de Leonor, entretanto já falecida, mergulhava nesse refúgio tão amiúde que, se não fosse a tia, tantas vezes a criança ficaria sem jantar.
Por isso, o João retribuía com genuína boa vontade e dava agora o jantar à tia, levando-lhe a comida à boca em aviõezinhos com uma paciência infinita. De seguida, lavava e enxugava a louça enquanto a tia roncava alto em frente à televisão.
Levava-a depois para a cama com todo o cuidado para não a despertar totalmente, pois a tia Leonor fazia birras infantis para não se deitar. Verificava a fralda, ajeitava os cobertores, dispunha os chinelos ao lado da cama e ligava a luz de presença no quarto. Muitas vezes era acordado durante a noite pela tia que vagueava pela casa, toc toc toc, com os botins calçados: ia dizer ao sobrinho que preparasse as malas que queria ir para a terra. O João, com todo o desvelo, lá a convencia a regressar ao leito.
Numa manhã gelada de Janeiro, o telefone do João tocou e tocou. Que estranho!, a Lena raramente liga tão cedo... Que fosse depressa, a tia apagava-se...
Numa manhã gelada de Janeiro, dias depois, foi o funeral da tia Leonor. No fim do cerimonial, os dois filhos enlutados acercaram-se de um lacrimejante João. Mas ao invés de um obrigado e duas palmadinhas nas costas, apressaram-se em pedir: Ó primo, importas-te de devolver agora as chaves de casa da mãe? Queremos ir lá separar umas coisas e, como vês, já não precisamos dos teus serviços...
- Muito se engana quem cuida
Quem prova provérbios gosta de aliterações
Provérbio provado rimado - DCCXLVII
Um provérbio ou uma expressão
Prendem-me tanto a atenção
Fervilham logo as ideias
Sejam bonitas ou feias
Tudo me serve de mote
Vou com muita sede ao pote
Em cada verso uma entrega
E mesmo assim nunca chega
Prendem-me tanto a atenção
Fervilham logo as ideias
Sejam bonitas ou feias
Tudo me serve de mote
Vou com muita sede ao pote
Em cada verso uma entrega
E mesmo assim nunca chega
Quem prova provérbios gosta de aliterações
Provérbio provado num verso branco - LXIX
Espero-te diariamente como quem numa paragem um autocarro
Que invariavelmente não passa à hora marcada
E a cada dia novas cores e trajectos surpresa e partes gagas
Enquanto não passas não acordo nem posso adormecer
Escuto muito ao longe o chiar dos teus pneus
Carecas de tantas contracurvas e cedências de prioridade
E preparo o joelho que trepará o teu primeiro degrau
Em ti há uma porta para entrar enter
outra para sair exit
Mas a verdade é que ando sempre à pendura
Fugindo dos fiscais de calças azuis escuras
Evitando o suor dos outros
passageiros
Todavia tu o veículo pesado por onde me desejo amanhã transportar
Que invariavelmente não passa à hora marcada
E a cada dia novas cores e trajectos surpresa e partes gagas
Enquanto não passas não acordo nem posso adormecer
Escuto muito ao longe o chiar dos teus pneus
Carecas de tantas contracurvas e cedências de prioridade
E preparo o joelho que trepará o teu primeiro degrau
Em ti há uma porta para entrar enter
outra para sair exit
Mas a verdade é que ando sempre à pendura
Fugindo dos fiscais de calças azuis escuras
Evitando o suor dos outros
passageiros
Todavia tu o veículo pesado por onde me desejo amanhã transportar
Quem prova provérbios gosta de aliterações
Provérbio provado rimado - DCCXLVI
Vem cá baixo ver ó Jesus
Que se me apaga a luz
Prestes a dar-me o fanico
O pernil não tarda estico
Liga lá a tua sirene
Intermitente ou perene
Chama um anjo e um querubim
Da nuvem mais perto de mim
É hora do apocalipse
Ou de mais comum eclipse
Já chegam os cavaleiros
Com farda de enfermeiros
Quero com estilo finar-me
Ter uma morte com charme
Que cause um engarrafamento
Ao menos num breve momento
A caminho do hospital
Começo a bater mal
A temer novamente a vida
Quando nasci prometida
Jesus ainda não é desta
Que me pões a coroa na testa
Vou ficar mais um tempinho
A ser cá em baixo anjinho
Que se me apaga a luz
Prestes a dar-me o fanico
O pernil não tarda estico
Liga lá a tua sirene
Intermitente ou perene
Chama um anjo e um querubim
Da nuvem mais perto de mim
É hora do apocalipse
Ou de mais comum eclipse
Já chegam os cavaleiros
Com farda de enfermeiros
Quero com estilo finar-me
Ter uma morte com charme
Que cause um engarrafamento
Ao menos num breve momento
A caminho do hospital
Começo a bater mal
A temer novamente a vida
Quando nasci prometida
Jesus ainda não é desta
Que me pões a coroa na testa
Vou ficar mais um tempinho
A ser cá em baixo anjinho
Quem prova provérbios gosta de aliterações
Provérbio provado rimado - DCCXLV
É do ano o terceiro mês
O Março tão inconstante
Se de manhã chuva vês
O sol surge de rompante
Ditado certo e eterno
O do Março Marçagão
As manhãs parecem de inverno
Nas tardes julgamos que é verão
O Março tão inconstante
Se de manhã chuva vês
O sol surge de rompante
Ditado certo e eterno
O do Março Marçagão
As manhãs parecem de inverno
Nas tardes julgamos que é verão
Quem prova provérbios gosta de aliterações
sábado, 14 de dezembro de 2019
Provérbios Provados no Livro das caras
Pequenos contos, rimas de pé quebrado e verso branco a partir de provérbios e expressões idiomáticas
Quem prova provérbios gosta de aliterações
Provérbio provado rimado - DCCXLIV
Dar costas e dar também pau
É comportamento tão mau
É pôr tudo à disposição
Entregar o ouro ao ladrão
Há que a pele engrossar
E ninguém deixar abusar
O coração endurecer
Ser um osso duro de roer
É comportamento tão mau
É pôr tudo à disposição
Entregar o ouro ao ladrão
Há que a pele engrossar
E ninguém deixar abusar
O coração endurecer
Ser um osso duro de roer
Quem prova provérbios gosta de aliterações
sexta-feira, 13 de dezembro de 2019
Provérbio provado de um engenheiro inventado
Há muito muito tempo trabalhei numa agência de viagens especializada em mergulho subaquático, um dos tantos trabalhos inusitados que tive enquanto não atinava com a minha verdadeira vocação. Invejo um pouco as pessoas que tiveram sempre rumo: à minha irmã, por exemplo, desde a mais tenra infância lhe escutei a vontade de vir a ser professora primária, profissão que efectivamente exerce.
Fui arregimentada para a tarefa num evento de marketing desportivo por um dos patrões da mencionada agência, um francês chauvinista, como o são um pouco todos os franceses, que tratava os portugueses com uma condescendência irritante - até os seus pares, até os seus clientes. Manifestamente ter-me-á contratado por saber que me poderia pagar tuta e meia e até moldar-me às suas exigências de rigor laboral, mas a coisa não lhe terá corrido muito bem...
Apesar de não ir muito à bola com o francês, quando conheci o seu sócio português as minhas expectativas de poder vir a gostar daquela agência defraudaram-se ainda mais. Era um fulano bem parecido, imerso em tiques de beto no trajar e no linguajar. Tinha inclusive um certo esgar de desprezo na forma como colocava os lábios que se destinava a manter a distância dos que não eram da sua pretensa estirpe. Tratava-me com tamanha altivez que eu chegava a ter dó da sua desmesurada idiotice.
Percebi ao cabo de poucos dias a que distintas famílias se gabava de pertencer: a mãe dele quando telefonava pedia para falar com o Doutor Paulo. A cagança era, pois, genética.
O pior é que o dito Doutor não sabia alinhavar o sujeito com o predicado e confundia a segunda pessoa do singular com a do plural. Perguntava aqui à miúda como se escrevia isto e aqueloutro, confiante de que os calhamaços do Lobo Antunes que eu transportava me haviam de estar ensinando alguma coisa, já que para agente de viagens não parecia acusar muita habilidade. Tenho ideia que seria engenheiro, pelo menos uns relatórios científicos terá escrito ou terão escrito por ele. Mas agora que penso nisso, nunca falava nos tempos de faculdade... Será que a mãezinha tinha uma cunha na farinha Amparo?
Os dois sócios andavam permanentemente de candeias às avessas, não se suportando mutuamente - nem com molho de tomate! - e não concordando em coisa alguma: o ambiente era de cortar à faca. Por isso, quando algum deles se ausentava aplicava-se sumamente a máxima:
- Patrão fora, dia santo na loja
Fui arregimentada para a tarefa num evento de marketing desportivo por um dos patrões da mencionada agência, um francês chauvinista, como o são um pouco todos os franceses, que tratava os portugueses com uma condescendência irritante - até os seus pares, até os seus clientes. Manifestamente ter-me-á contratado por saber que me poderia pagar tuta e meia e até moldar-me às suas exigências de rigor laboral, mas a coisa não lhe terá corrido muito bem...
Apesar de não ir muito à bola com o francês, quando conheci o seu sócio português as minhas expectativas de poder vir a gostar daquela agência defraudaram-se ainda mais. Era um fulano bem parecido, imerso em tiques de beto no trajar e no linguajar. Tinha inclusive um certo esgar de desprezo na forma como colocava os lábios que se destinava a manter a distância dos que não eram da sua pretensa estirpe. Tratava-me com tamanha altivez que eu chegava a ter dó da sua desmesurada idiotice.
Percebi ao cabo de poucos dias a que distintas famílias se gabava de pertencer: a mãe dele quando telefonava pedia para falar com o Doutor Paulo. A cagança era, pois, genética.
O pior é que o dito Doutor não sabia alinhavar o sujeito com o predicado e confundia a segunda pessoa do singular com a do plural. Perguntava aqui à miúda como se escrevia isto e aqueloutro, confiante de que os calhamaços do Lobo Antunes que eu transportava me haviam de estar ensinando alguma coisa, já que para agente de viagens não parecia acusar muita habilidade. Tenho ideia que seria engenheiro, pelo menos uns relatórios científicos terá escrito ou terão escrito por ele. Mas agora que penso nisso, nunca falava nos tempos de faculdade... Será que a mãezinha tinha uma cunha na farinha Amparo?
Os dois sócios andavam permanentemente de candeias às avessas, não se suportando mutuamente - nem com molho de tomate! - e não concordando em coisa alguma: o ambiente era de cortar à faca. Por isso, quando algum deles se ausentava aplicava-se sumamente a máxima:
- Patrão fora, dia santo na loja
Quem prova provérbios gosta de aliterações
quinta-feira, 12 de dezembro de 2019
Provérbio autobiográfico - II
Desde os catorze anos que escrevo poesia, a prosa veio mais tarde e normalmente num tom poético e ainda confessional. Pequenas histórias com personagens ficcionadas, princípio, meio e fim, mais tarde ainda.
Regressemos então ao princípio, para que esta seja uma pequena história, apesar de assim confessional. Convém referir que o prazer da leitura foi uma obsessão que me derrubou como um raio quando aprendi a ler na longínqua primeira classe e aí comecei a desenvolver o amor ao objecto livro. Mas lia tudo o que apanhava: desde jornais e revistas até à publicidade existente nas ruas, lojas e supermercados, menos omnipresente contudo do que nos dias de hoje. Recordo-me perfeitamente do dia em que li pela primeira vez: regressava da escola à tarde e reparei numas letras azuis pintadas ao lado da porta do meu prédio; foi assim que a minha primeira frase foi VOTA APU.
Continuei sempre a ler, a ler muito; tanto que a minha avó dizia que me estragaria a vista. E as avós têm sempre razão: na terceira classe já acusava dioptrias precoces e comecei assim a usar óculos com nove anos. Com os ditos na ponta do nariz, iniciei-me na chamada literatura para adultos. Ataquei Uma família inglesa e depois as Obras completas de Júlio Dinis, uma colecção de capa dura, monótona, verde escura que repousava nas estantes familiares. Percorri todas essas prateleiras com curiosidade e dedicação, até perceber que por mais voltas que desse Malraux não era para a minha idade.
Tinha eu os supracitados catorze e comecei a fazer tentativas de versos em folhas pautadas que coleccionava num dossier. Pus de parte uns dez poemas e levei-os a ler à minha professora de português do oitavo ano. Levava um soneto quase perfeito, uma coisinha de arrancar Ohs de espanto e admiração no meu entender. Mas a professora não me deu grande saída: foi cortês e elogiou-me apenas o suficiente. Não sei onde pára esse dossier, perdido eventualmente lá na terra entre antigos livros escolares e testes com boas classificações.
Depois vieram os caderninhos dos mais variados tamanhos e feitios, muitos deles com capas às flores, uma colecção que me faz viajar até aos anos noventa da minha juventude e início da idade adulta. Neles tantos desabafos e dores de cotovelo, numa insatisfação sem nome, cantiga da mó de baixo.
Num dia de 2008 - e aqui muitos já sabem sobejamente onde isto vai parar - iniciei o blog dos Provérbios Provados que acabou por me trazer a vós: uma página onde escrevo pequenos textos, rimas de pé quebrado e verso branco a partir de provérbios e expressões idiomáticas. Pelo caminho, um livrinho de poesia publicado em 2018, um projecto de contos já pronto a editar, um romance sensivelmente a meio.
Fui perdendo a vergonha de mostrar o que escrevo, apesar de saber que muitas vezes não tem a qualidade que gostaria. A literatura sempre a coisa mais importante da minha vida. O sonho que me salva, que me faz respirar e ter a pretensão de ajudar também outros a respirar
- O sonho comanda a vida
(Escrito em 2019)
Regressemos então ao princípio, para que esta seja uma pequena história, apesar de assim confessional. Convém referir que o prazer da leitura foi uma obsessão que me derrubou como um raio quando aprendi a ler na longínqua primeira classe e aí comecei a desenvolver o amor ao objecto livro. Mas lia tudo o que apanhava: desde jornais e revistas até à publicidade existente nas ruas, lojas e supermercados, menos omnipresente contudo do que nos dias de hoje. Recordo-me perfeitamente do dia em que li pela primeira vez: regressava da escola à tarde e reparei numas letras azuis pintadas ao lado da porta do meu prédio; foi assim que a minha primeira frase foi VOTA APU.
Continuei sempre a ler, a ler muito; tanto que a minha avó dizia que me estragaria a vista. E as avós têm sempre razão: na terceira classe já acusava dioptrias precoces e comecei assim a usar óculos com nove anos. Com os ditos na ponta do nariz, iniciei-me na chamada literatura para adultos. Ataquei Uma família inglesa e depois as Obras completas de Júlio Dinis, uma colecção de capa dura, monótona, verde escura que repousava nas estantes familiares. Percorri todas essas prateleiras com curiosidade e dedicação, até perceber que por mais voltas que desse Malraux não era para a minha idade.
Tinha eu os supracitados catorze e comecei a fazer tentativas de versos em folhas pautadas que coleccionava num dossier. Pus de parte uns dez poemas e levei-os a ler à minha professora de português do oitavo ano. Levava um soneto quase perfeito, uma coisinha de arrancar Ohs de espanto e admiração no meu entender. Mas a professora não me deu grande saída: foi cortês e elogiou-me apenas o suficiente. Não sei onde pára esse dossier, perdido eventualmente lá na terra entre antigos livros escolares e testes com boas classificações.
Depois vieram os caderninhos dos mais variados tamanhos e feitios, muitos deles com capas às flores, uma colecção que me faz viajar até aos anos noventa da minha juventude e início da idade adulta. Neles tantos desabafos e dores de cotovelo, numa insatisfação sem nome, cantiga da mó de baixo.
Num dia de 2008 - e aqui muitos já sabem sobejamente onde isto vai parar - iniciei o blog dos Provérbios Provados que acabou por me trazer a vós: uma página onde escrevo pequenos textos, rimas de pé quebrado e verso branco a partir de provérbios e expressões idiomáticas. Pelo caminho, um livrinho de poesia publicado em 2018, um projecto de contos já pronto a editar, um romance sensivelmente a meio.
Fui perdendo a vergonha de mostrar o que escrevo, apesar de saber que muitas vezes não tem a qualidade que gostaria. A literatura sempre a coisa mais importante da minha vida. O sonho que me salva, que me faz respirar e ter a pretensão de ajudar também outros a respirar
- O sonho comanda a vida
(Escrito em 2019)
Quem prova provérbios gosta de aliterações
Provérbio provado rimado - DCCXLIII
Para saberes se um homem
Não quer só sexo fazer
Porquanto tantos consomem
Tudo o que lhes aparecer
É propor apenas dormir
Numa agradável conchinha
Verás se quer dividir
Ou se te deixa sozinha
Porque o sono partilhar
É romântico que se farta
E se ele enfim ressonar
Vá para o raio que o parta
Não quer só sexo fazer
Porquanto tantos consomem
Tudo o que lhes aparecer
É propor apenas dormir
Numa agradável conchinha
Verás se quer dividir
Ou se te deixa sozinha
Porque o sono partilhar
É romântico que se farta
E se ele enfim ressonar
Vá para o raio que o parta
Quem prova provérbios gosta de aliterações
Provérbio provado rimado - DCCXLII
Se eu tivesse um jardim
Teria amores-perfeitos
Tu cuidarias de mim
Podavas os caules desfeitos
O meu fiel jardineiro
Semeavas e cuidavas
Desde Março a Fevereiro
O meu jardim tu regavas
Quando viessem os ventos
Terias especial cuidado
E serias nesses momentos
O meu melhor namorado
Tu nunca desistirias
De me colher quando quero
Com tristezas e manias
Voltar à estaca zero
Teria amores-perfeitos
Tu cuidarias de mim
Podavas os caules desfeitos
O meu fiel jardineiro
Semeavas e cuidavas
Desde Março a Fevereiro
O meu jardim tu regavas
Quando viessem os ventos
Terias especial cuidado
E serias nesses momentos
O meu melhor namorado
Tu nunca desistirias
De me colher quando quero
Com tristezas e manias
Voltar à estaca zero
Quem prova provérbios gosta de aliterações
quinta-feira, 5 de dezembro de 2019
Provérbio do bom bandido
O Paulo deixou a escola tão cedo que nem aprendeu convenientemente a ler e a escrever. Eram muito, tão!, pobres lá em casa que era preciso trabalhar para ajudar a família. Não foi prejudicado nem privilegiado: todos os quatro irmãos Santos tiveram a mesma sorte.
O Paulo tornou-se então precocemente um miúdo a alancar nas obras com homens feitos. Saía com eles após o trabalho e iam para as tascas beber e fumar; às vezes iam às meninas para aliviar a tensão. Em tudo o Paulo alinhava, sentido-se crescido, achando que aproveitava da melhor forma o dinheiro que não tinha que entregar em casa.
Um dia conheceu o amigo de um colega. O Alberto era barulhento, divertido à brava, um pouco apoquentado, e andava sempre com uma valente moca. Tinha um carro vistoso, amarelo, e começaram a dar umas voltas e a andar sempre juntos, o Paulo e o Alberto. Foi assim que o miúdo que se achava suficientemente crescido fumou o primeiro charro e em poucos meses já estava a dar no cavalo. Deixou de entregar dinheiro em casa. Na casa onde já quase mal aparecia.
Até começarem a fazer bombas de gasolina foi um pulinho. Operavam com facas, de noite, perto da hora do fecho. O Alberto é que era o cabecilha: engendrava os ataques, conduzia o carro, extorquia o dinheiro e dava voz de comando ao Paulo que se limitava a fazer figura de corpo presente, empunhando a faca enquanto a ressaca tomava conta de si.
Claro que a sorte um dia deixa de bater à porta e foram catados. No xelindró o Paulo desbroncou-se todo e entregou o Alberto que ficou preso. Os polícias acenaram-lhe com um tratamento e foi o bastante para o Paulo vislumbrar uma hipótese de um futuro diferente e uma reaproximação à família Santos.
Foi para uma comunidade terapêutica no meio do campo onde esteve um ano a tomar metadona e a fazer intrincados exercícios psicológicos. Chegou a ter uma paixão platónica por uma rapariga de boas famílias que se tinha agarrado à cocaína e que tomou em mãos a tarefa de o ensinar a ler e a escrever.
Saíu limpo, disposto à reinserção social e a ir tirar um curso de cozinha. Regressou para casa dos pais e logo na primeira semana reencontrou velhos colegas e amigos do bairro: a notícia de que tinha voltado correu célere.
Numa noite voltava sozinho a pé do café e saiu-lhe ao caminho um sujeito desdentado. O Paulo só teve tempo de ver a lâmina da faca e ouvir a frase: Venho da parte do Alberto, ele manda cumprimentos da prisão...
- Bandido bom é bandido morto
O Paulo tornou-se então precocemente um miúdo a alancar nas obras com homens feitos. Saía com eles após o trabalho e iam para as tascas beber e fumar; às vezes iam às meninas para aliviar a tensão. Em tudo o Paulo alinhava, sentido-se crescido, achando que aproveitava da melhor forma o dinheiro que não tinha que entregar em casa.
Um dia conheceu o amigo de um colega. O Alberto era barulhento, divertido à brava, um pouco apoquentado, e andava sempre com uma valente moca. Tinha um carro vistoso, amarelo, e começaram a dar umas voltas e a andar sempre juntos, o Paulo e o Alberto. Foi assim que o miúdo que se achava suficientemente crescido fumou o primeiro charro e em poucos meses já estava a dar no cavalo. Deixou de entregar dinheiro em casa. Na casa onde já quase mal aparecia.
Até começarem a fazer bombas de gasolina foi um pulinho. Operavam com facas, de noite, perto da hora do fecho. O Alberto é que era o cabecilha: engendrava os ataques, conduzia o carro, extorquia o dinheiro e dava voz de comando ao Paulo que se limitava a fazer figura de corpo presente, empunhando a faca enquanto a ressaca tomava conta de si.
Claro que a sorte um dia deixa de bater à porta e foram catados. No xelindró o Paulo desbroncou-se todo e entregou o Alberto que ficou preso. Os polícias acenaram-lhe com um tratamento e foi o bastante para o Paulo vislumbrar uma hipótese de um futuro diferente e uma reaproximação à família Santos.
Foi para uma comunidade terapêutica no meio do campo onde esteve um ano a tomar metadona e a fazer intrincados exercícios psicológicos. Chegou a ter uma paixão platónica por uma rapariga de boas famílias que se tinha agarrado à cocaína e que tomou em mãos a tarefa de o ensinar a ler e a escrever.
Saíu limpo, disposto à reinserção social e a ir tirar um curso de cozinha. Regressou para casa dos pais e logo na primeira semana reencontrou velhos colegas e amigos do bairro: a notícia de que tinha voltado correu célere.
Numa noite voltava sozinho a pé do café e saiu-lhe ao caminho um sujeito desdentado. O Paulo só teve tempo de ver a lâmina da faca e ouvir a frase: Venho da parte do Alberto, ele manda cumprimentos da prisão...
- Bandido bom é bandido morto
Quem prova provérbios gosta de aliterações
Provérbio provado rimado - DCCXLI
O mar é a religião
De toda a mãe Natureza
Olhá-lo é qual oração
Por tocar no céu de certeza
É a linha do horizonte
Que confunde o céu com o mar
E o sol que nela desponte
De manhã se ponha a brilhar
Vê-lo ao longe ou vê-lo de perto
Aspirar a nítida maresia
Das melhores sensações decerto
Que podemos ter qualquer dia
Tudo isto com que aqui rimo
São verdades de La Palisse
Mas apenas a vós vos confirmo
Lembrar-se-ão daquilo que disse
De toda a mãe Natureza
Olhá-lo é qual oração
Por tocar no céu de certeza
É a linha do horizonte
Que confunde o céu com o mar
E o sol que nela desponte
De manhã se ponha a brilhar
Vê-lo ao longe ou vê-lo de perto
Aspirar a nítida maresia
Das melhores sensações decerto
Que podemos ter qualquer dia
Tudo isto com que aqui rimo
São verdades de La Palisse
Mas apenas a vós vos confirmo
Lembrar-se-ão daquilo que disse
Quem prova provérbios gosta de aliterações
Provérbio provado rimado - DCCXL
A vida é um gelado rio
Onde tememos de frio
Com esforço vamos nadando
E contra a maré remando
Os outros peixes que nadam
Nem sempre muito agradam
Pois ocupam o seu espaço
Olhando somente o regaço
A lição que aqui há a tirar
É deixá-los também nadar
Não há muito mais a fazer
Que viver e deixar viver
Onde tememos de frio
Com esforço vamos nadando
E contra a maré remando
Os outros peixes que nadam
Nem sempre muito agradam
Pois ocupam o seu espaço
Olhando somente o regaço
A lição que aqui há a tirar
É deixá-los também nadar
Não há muito mais a fazer
Que viver e deixar viver
Quem prova provérbios gosta de aliterações
Provérbio provado rimado - DCCXXXIX
A maior parte das amizades
Trago da minha juventude
Que se prestou às realidades
De fazer amigos amiúde
Mas depois na vida adulta
Também tive bastantes contactos
Com gente mais ou menos culta
De maiores ou menores aparatos
A Ju foi um desses casos
Foi minha colega de trabalho
A vida traz destes acasos
No meio de tanto espantalho
Open space com mais de cem
Estava a meu lado sentada
Era tão destravada porém
E tinha uma grande pancada
Fui logo com a cara dela
Quando chegou de manhã
Ainda a limpar a remela
No meio do maior afã
Às vezes a Ju praguejava
Se lhe dava na veneta
As querelas não negava
Fazendo uma típica careta
Fiquei só um ano por lá
Saturei-me daquela agência
A Ju também já lá não está
Mas mantemos correspondência
Cada uma foi para o seu lado
Chegou um dia a despedida
Mas a amizade tem perdurado
Apesar das esquinas da vida
Trago da minha juventude
Que se prestou às realidades
De fazer amigos amiúde
Mas depois na vida adulta
Também tive bastantes contactos
Com gente mais ou menos culta
De maiores ou menores aparatos
A Ju foi um desses casos
Foi minha colega de trabalho
A vida traz destes acasos
No meio de tanto espantalho
Open space com mais de cem
Estava a meu lado sentada
Era tão destravada porém
E tinha uma grande pancada
Fui logo com a cara dela
Quando chegou de manhã
Ainda a limpar a remela
No meio do maior afã
Às vezes a Ju praguejava
Se lhe dava na veneta
As querelas não negava
Fazendo uma típica careta
Fiquei só um ano por lá
Saturei-me daquela agência
A Ju também já lá não está
Mas mantemos correspondência
Cada uma foi para o seu lado
Chegou um dia a despedida
Mas a amizade tem perdurado
Apesar das esquinas da vida
Quem prova provérbios gosta de aliterações
quarta-feira, 4 de dezembro de 2019
Provérbio provado rimado - DCCXXXVIII
Pneus e pregos misturados
Nunca deram bons resultados
Furei o meu que grande pincel
Mais despesa p'rá folha de Excel
Nunca deram bons resultados
Furei o meu que grande pincel
Mais despesa p'rá folha de Excel
Quem prova provérbios gosta de aliterações
Provérbio provado rimado - DXCCXXXVII
Na garagem pisas baratas
Mas dificilmente as matas
É bicho muito resistente
Não expira sob o pé da gente
Há pessoas por certo assim
A aguentar firme até ao fim
Sempre de cabeça levantada
Abaixo não as deita nada
Têm qualidades várias
Às vezes são autoritárias
Em frente sempre andando
No seu quero posso e mando
Mas dificilmente as matas
É bicho muito resistente
Não expira sob o pé da gente
Há pessoas por certo assim
A aguentar firme até ao fim
Sempre de cabeça levantada
Abaixo não as deita nada
Têm qualidades várias
Às vezes são autoritárias
Em frente sempre andando
No seu quero posso e mando
Quem prova provérbios gosta de aliterações
segunda-feira, 2 de dezembro de 2019
Provérbio provado calcorreado
O local desta história é uma vila histórica e muralhada onde decorre um evento literário outonal. As personagens três mulheres acompanhadas pelo filho de uma delas, criança curiosa sem ser birrenta ou mal comportada.
À hora em que começa a história propriamente dita, as ruas ficaram de repente estranhamente desertas. Há mais de meia hora que sobem e descem, descem e sobem, o empedrado irregular, entrando e saindo das muralhas, à procura de um restaurante que a memória de uma das mulheres tenta convocar. Têm muita fome e a noite já desceu; desceu uma noite de Outono, a primeira verdadeira noite húmida e fria daquele Outono, e estão mal agasalhadas. Os restaurantes que vão encontrando todos caríssimos, fora de questão para o orçamento que haviam estipulado. Uma das mulheres prestes a transformar-se numa criança birrenta e mal comportada, para além de constipada, mas a criança mantém-se imperturbável.
Às tantas, aparece ao virar de uma esquina, um restaurante sem aquele ar de armar ao pingarelho, as letras Churrasqueira pintadas no toldo. As mulheres sorriem, estão cansadas, já nem querem apreçar: É já aqui! Entram portas adentro de sopetão e deparam-se com toda a comitiva de escritores e artistas do festival literário: Ora bolas, isto é só para convidados!
A mãe da criança e o seu rebento são imediatamente reconhecidos por um amigo, pois o pai da criança era o gajo que iria actuar no dia seguinte com a sua viola no encerramento do festival. O amigo tem a ideia peregrina de sugerir às quatro esfaimadas criaturas que dêem o nome como acompanhantes do gajo, olha agora!
E foi mesmo assim que sucedeu: zero opções gastronómicas transformaram-se num catering variado que incluía bebidas e sobremesas. Tudo à borla, claro.
- Quem ri por último, ri melhor
À hora em que começa a história propriamente dita, as ruas ficaram de repente estranhamente desertas. Há mais de meia hora que sobem e descem, descem e sobem, o empedrado irregular, entrando e saindo das muralhas, à procura de um restaurante que a memória de uma das mulheres tenta convocar. Têm muita fome e a noite já desceu; desceu uma noite de Outono, a primeira verdadeira noite húmida e fria daquele Outono, e estão mal agasalhadas. Os restaurantes que vão encontrando todos caríssimos, fora de questão para o orçamento que haviam estipulado. Uma das mulheres prestes a transformar-se numa criança birrenta e mal comportada, para além de constipada, mas a criança mantém-se imperturbável.
Às tantas, aparece ao virar de uma esquina, um restaurante sem aquele ar de armar ao pingarelho, as letras Churrasqueira pintadas no toldo. As mulheres sorriem, estão cansadas, já nem querem apreçar: É já aqui! Entram portas adentro de sopetão e deparam-se com toda a comitiva de escritores e artistas do festival literário: Ora bolas, isto é só para convidados!
A mãe da criança e o seu rebento são imediatamente reconhecidos por um amigo, pois o pai da criança era o gajo que iria actuar no dia seguinte com a sua viola no encerramento do festival. O amigo tem a ideia peregrina de sugerir às quatro esfaimadas criaturas que dêem o nome como acompanhantes do gajo, olha agora!
E foi mesmo assim que sucedeu: zero opções gastronómicas transformaram-se num catering variado que incluía bebidas e sobremesas. Tudo à borla, claro.
- Quem ri por último, ri melhor
Quem prova provérbios gosta de aliterações
Provérbio provado rimado - DCCXXXVI
Se vens estragar o que está feito
Podes estacar e recuar direito
Vens borrar a pintura é o que se vê
Não adianta ser em dégradé
Podes estacar e recuar direito
Vens borrar a pintura é o que se vê
Não adianta ser em dégradé
Quem prova provérbios gosta de aliterações
Provérbio provado rimado - DCCXXXV
Eu cá não gosto de peixe cru
Se está na moda come-o tu
Nunca percebi tanta histeria
O sushi a mim dá-me azia
E o gin que também está na moda
Põe-me a cabeça a andar à roda
Não me agrada ao meu palato
Mas todos fazem dele aparato
São duas coisas muito caras
Não dão para carteiras avaras
Dão porém azo a imitações
Para quem quer poupar uns tostões
Assim é trendy com pouco dinheiro
Aquele que quer parecer lampareiro
Estar nos locais com ar moderninho
De barba aparada bem penteadinho
Mas não pode sempre surgir influente
Nem todo o dia se come pão quente
Dentro de portas come torradas
Como as pessoas remediadas
Se está na moda come-o tu
Nunca percebi tanta histeria
O sushi a mim dá-me azia
E o gin que também está na moda
Põe-me a cabeça a andar à roda
Não me agrada ao meu palato
Mas todos fazem dele aparato
São duas coisas muito caras
Não dão para carteiras avaras
Dão porém azo a imitações
Para quem quer poupar uns tostões
Assim é trendy com pouco dinheiro
Aquele que quer parecer lampareiro
Estar nos locais com ar moderninho
De barba aparada bem penteadinho
Mas não pode sempre surgir influente
Nem todo o dia se come pão quente
Dentro de portas come torradas
Como as pessoas remediadas
Quem prova provérbios gosta de aliterações
Provérbio provado rimado - DCCXXXIV
Pato bravo culto não o negues
É o que escreve livros de cheques
Construtor civil improvisado
Faz o serviço mal orçamentado
De má qualidade é a sua obra
Zangas e fúrias há-as de sobra
Dá sempre barraca nos dois sentidos
Apanha os clientes desprevenidos
É um pato dos espertalhões
É assim que arrecada milhões
Há desta espécie por todo o país
Diz que faz e não faz o que diz
Tem uma postura característica
Digna de figurar na estatística
Usa relógio de ouro todo o ano
Engana fulano beltrano e sicrano
É o que escreve livros de cheques
Construtor civil improvisado
Faz o serviço mal orçamentado
De má qualidade é a sua obra
Zangas e fúrias há-as de sobra
Dá sempre barraca nos dois sentidos
Apanha os clientes desprevenidos
É um pato dos espertalhões
É assim que arrecada milhões
Há desta espécie por todo o país
Diz que faz e não faz o que diz
Tem uma postura característica
Digna de figurar na estatística
Usa relógio de ouro todo o ano
Engana fulano beltrano e sicrano
Quem prova provérbios gosta de aliterações
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