Provérbios Provados noutras casas:

sábado, 18 de novembro de 2023

Provérbio provado despropositado

A Eunice até era boa pessoa: tinha bom fundo, melhores intenções e o conselho certo para cada chapéu. Sabia muito bem o que o interlocutor desejava ouvir e calçava como uma luva o papel do chinelo roto. Do outro lado, o pé descalço sentia-se confortado, concordando com a Eunice embevecido.

O problema era outro. E era grande. Do alto do seu metro e setenta e tal e formas bem arredondadas, o problema era grande. A Eunice era a pior colega de sempre, não cooperando em nenhuma das tarefas que lhe propunham. 

Pedir ajuda à Eunice? Era para esquecer. Precisar que fosse buscar algo? Mais valia dar corda aos sapatos. Realizar qualquer ocupação a quatro mãos? Ela não mexia uma palha e ainda ficava com os louros. Sim, porque a Eunice gostava de fazer bonito com o trabalho dos outros.

Não dava para concluir se era burra ou apenas calona, só se percebia que não estava disposta a dar ordem de marcha aos neurónios. E, tal como quem menos dedos tem na testa, tinha a mania que era sabichona. Que sabia muito da poda. Sempre que pigarreava para botar alto a faladura, dava mesmo vontade de se lhe soprar: Cala-te lá, Eunice, cada vez te enterras mais...

Ela não tinha caído no caldeirão, mas cagava cada sentença com toda a pujança de que era capaz. Era tal a entoação estudada que emprestava à voz que se achava até competente para ensinar a missa ao próprio padre. 

A Eunice, lá no seu fantasioso mundinho, ainda estava à espera da promoção que injustamente lhe fora sonegada. Ainda à espera, porém sentada. Havia tentado vários concursos para outros postos de trabalho mas nunca tinha ficado colocada em nenhuma das opções; com grande pesar seu não era seleccionada. Então tinha de aguentar este emprego mal pago. Este emprego, sim, porque não era verdadeiramente um trabalho. Tendo em conta esse factor, a Eunice até nem auferia pouco, uma vez que o esforço que lhe dedicava era nulo.

Umas colegas chegavam, outras partiam. Partiam por fim para a ansiada reforma ou na direcção de outras colocações. A Eunice não sabia o que fazer a tanto ressaibo. Por isso mandava bocas parvas. Tentava denegrir as competências alheias. Enchia o peito de ar em presença de um bigode grosso.

Numa certa ocasião em que se dava mais uma troca de cadeiras, lá ia dando as boas-vindas de um lado e desejando muita sorte do outro a quem progredia na carreira. E, apesar de não ser sequer capaz de suster uma cabeça de alfinete, a Eunice fez o seguinte comentário para a geral: Umas vão e outras vêm e cá fico eu a


- Segurar as pontas 

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