Provérbios Provados noutras casas:

terça-feira, 16 de junho de 2020

Provérbio provado diferenciado

A Benedita era o que comummente se chama uma mulher interessante, pois reunia vários predicados: bonita e relativamente bem feita, considerada inteligente, divertida e espirituosa por quem com ela privava, também era sensível e empática. Claro que tinha defeitos, quem os não tiver que atire a primeira pedra nesse terreno xistoso; assim, a Benedita era egocêntrica - se bem que nada egoísta, embora possa parecer paradoxal -, pouco poupada e um bocado preguiçosa, só para mencionar alguns. Estes senãos eram pelo visto contornáveis, já que a Benedita tinha imensa saída entre o sexo oposto: a sua presença acendia fogos insuspeitos nos mais variados tipos de homem. Além dos que ia conhecendo no seu quotidiano presente, era frequente ser alvo de confissões de desejos recalcados no passado por indivíduos que finalmente ganhavam coragem para dizer da sua antiga vontade por ela. 
A Benedita estava habituada a toda essa atenção masculina, mas isso não a envaidecia por aí além pois normalmente tamanha oferta se saldava numa fila interminável de homens dispostos a levá-la para a cama. Benedita não achava isso nada de especial: de sexo até os passarinhos gostam, ainda que a fêmea não seja atraente. Do que ela sentia falta era de uma afeição verdadeira, de quem desejasse permanecer após o impulso sexual, quem se interessasse pelo seu âmago apesar das suas condicionantes. 
Ainda solteira depois de ter completado os quarenta, a Benedita estava já enjoada e de cabeça à roda de tanto circular num carrossel de relações intensas e pouco duradouras. Apesar disso, não se vergava aos estereótipos sociais que ditam os comportamentos femininos e continuava fiel a si própria. Curiosamente, não tinha perdido a esperança de encontrar a tampa para a sua panela fervente: tantas decepções não a haviam tornado amarga ou ressentida e encarava a sua pouca sorte no amor com evidente bom humor. 
Um belo dia, no meio da habitual plateia que por ela babava, surgiu-lhe o Jorge. Ao primeiro olhar não havia nada de extravagante que o distinguisse dos demais, até porque ele era tão discreto que aparentemente não se destacava na mole predadora. Mas a Benedita não fechou a porta: raramente se precipitava nesse gesto por acreditar que todos tinham direito à sua oportunidade de a impressionar. Em boa hora o fez, já que Jorge pôde mostrar e disparar as suas armas e surpreendê-la. Sim, Benedita quedou-se surpreendida: sensação que julgava desconhecida, de tal modo já adivinhava por antecipação o modus operandi dos machos que lhe faziam a corte.
Se bem que tímido, o Jorge era erudito e elegante na aproximação e cedo Benedita verificou que estava perante outro tipo de postura quando ele manifestou uma genuína vontade de a conhecer por inteiro. Isso notava-se na sua actuação que era consistente e ausente de qualquer conversa de teor sexual. Benedita ficou abismada e não demorou a espicaçá-lo com os trunfos que estava acostumada a jogar. Pura perda de tempo: se sequer reparou nos seus avanços, Jorge ignorou-os olimpicamente e prosseguiu adstrito ao seu comportamento recto. Sem saber, sem querer, conquistou-a pela diferença, deixando-a pelo beicinho, desejando assim Benedita mais e mais interacção com aquele homem com agá grande. 

- A farinha é a mesma, mas o pão pode ser diferente 

Sem comentários: