Já não lhe bastava a janela que ia ficando cada vez mais pequena à medida que os dias se sucediam. Desligou a televisão que debitava notícias do apocalipse há três semanas ininterruptamente. Atirou com estrondo com todas as portas que se lhe atravessaram no caminho. Na última, a do prédio, fez estalar um vidro, mas André nem olhou para trás para verificar o estrago. Uma vez na rua inspirou o mais fundo que pôde, tantas vezes quantas pôde aspirar o ar levemente primaveril.
Sim, fugia daquelas quatro paredes, daquele André confinado, do isolamento a que o tinham obrigado, da quarentena imposta pelos telejornais. Largou a correr pelas ruas desertas; coisa inédita: na cidade encontrar-se mais árvores do que pessoas. As poucas que se viam caminhavam apressadas, de máscara e luvas, acompanhando algum cão mais ou menos incontinente que as forçava a saídas regulares, após o que regressariam às suas casas onde esperariam com prudência que amainasse a hecatombe.
O André não quis saber de semáforos ligados nem de sirenes policiais: galgou escadas e virou esquinas, numa correria desenfreada plena de superfícies de contacto.
- A prudência espera, a imprudência foge
quarta-feira, 25 de março de 2020
Provérbio imprudente
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